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|Crítica| 'O Contador 2' (2025) - Dir. Gavin O'Connor

|Crítica| 'O Contador 2' (2025) - Dir. Gavin O'Connor

Crítica por Victor Russo.

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'O Contador 2' / Warner Bros. Pictures

 

Título Original: The Accountant 2 (EUA)
Ano: 2025
Diretor: Gavin O'Connor
Elenco: Ben Affleck, Jon Bernthal, Cynthia Addai-Robins, J.K. Simmons, Daniella Pineda e Robert Morgan.
Duração: 124 min.
Nota: 3,0/5,0
 

Gavin O’Connor retoma a franquia após quase uma década pensando menos em continuidade e mais em construir momentos, como esquetes em um filme de muitos personagens e poucas consequências

O Contador 2 chega nove anos após o primeiro e justificando o nome já em seu orçamento. Se em 2016 um filme de ação custando U$40 milhões já era uma raridade, em um momento que os blockbusters de super-heróis, sobretudo da Marvel, lucravam rios de dinheiro ao preço produção de mais de U$150-200 milhões (sem contar o gasto extensivo em marketing e ativações pelo globo), em 2025, com as produções cada vez mais caras (lembra do já esquecido The Electric State, da Netflix, com budget de U$320 milhões?), um longa com esse orçamento em Hollywood já está em vias de de deixar de ser chamado de “filme de médio-orçamento” e a um passo de ser considerado “baixo-orçamento”, por mais absurdo que pareça (e seja). A verdade é que os estúdios perceberam que as contas não estão fechando, os super-heróis não são mais garantia de bilhão, fazendo timidamente as obras que sempre dominaram o mercado, os filmes de gênero com orçamento entre U$30 e U$60 milhões, voltarem às telonas (após um hiato, em que parecia que o destino desses filmes seria para sempre os streamings). 

O botão de emergência é apertado e a franquia com Ben Affleck e Jon Bernthal dirigida por Gavin O’Connor volta à pauta. O primeiro longa é um exemplo simbólico do valor desse tipo de filme, fazendo os U$40 milhões de produção (e menos de U$80 milhões totais) virarem U$155 milhões em bilheteria (sem contar o dinheiro ganho em aluguel digital e acordos de streaming). Não precisa quebrar a banca com um filme, mas pagar as contas e trazer um lucro nada desprezível. Apesar da qualidade cinematográfica questionável, é uma obra (e agora franquia) agradavelmente honesta, do valor de produção ao trabalho com o cinema de gênero, passando por uma construção de mitologia sem grandes pretensões, fazendo de cada longa apenas mais um capítulo, sem muita ligação com o anterior, na vida desses irmãos matadores. É quase como uma obra que regula um mercado cada vez mais ansioso, imprevisível e à beira de um colapso. 

Se O Contador ainda mantinha uma certa seriedade, com bastante dificuldade de segurar esse interesse todo apenas como um thriller de ação e espionagem, a sequência, sem a necessidade de construir uma mitologia do zero, permite se entregar muito mais a um tom canastrão e deixar livre a interação entre Affleck (e o seu personagem autista, de abordagem problemática desde o anterior, mas que aqui ganha um contorno cômico e humano mais interessante) e Bernthal, no modo caricatura total. O’Connor compreende que (mais do que apenas por conta do título do filme) o mais verdadeiro de sua obra está nessa dinâmica meio tola dos dois irmãos assassinos que são incapazes de viverem uma vida normal e conviverem com pessoas reais, mesmo quando eles não têm muito o que fazer. 

Não à toa, as três melhores cenas do longa correspondem a uma exclusividade de ação dos dois. A primeira são os dois sentados em cima do trailer, em uma espécie de esquete de humor tão escrachada e deslocada do resto que mal faz questão de refinar o fundo verde, deixando claro que os dois estão sentados em uma cadeira e o resto é totalmente artificial e feito em computação gráfica. Passa longe de ser um problema, pelo contrário, é quando o filme realmente assume sua simplicidade total (algo que planeja desde o início, já que toda a trama e questões mais complexas da profissão são sempre explicadas a ponto de não ter importância qualquer nuance, dando destaque sempre para o avançar a partir desse cinema de gênero mais confortável). Se a relação dos opostos, com trilha brega e momento meloso, já é divertido o suficiente, melhora quando o filme dobra a aposta e na sequência seguinte leva os dois para um bar de música country. Basicamente O’Connor assume que sua dupla principal pouca importância tem para mover a trama, são apenas artifícios para momentos específicos, para responder quando a lei chega ao seu limite. Então, enquanto Medina (Cynthia Addai-Robinson) tenta solucionar o mistério envolvendo a máfia e uma personagem-fantasma, Chris e Braxton estão bebendo, arranjando briga, dando cantadas não intencionais e ainda permitindo vermos Affleck dançando de tênis de forma dura e calculada. É o filme rindo de si mesmo e da sua ineficiência de criar um conjunto.

A terceira cena finalmente tem o cinema de ação por essência, quando os dois lutam no México (todo o contexto mexicano e de outros países é tão raso e problemático quanto a abordagem do autismo e das crianças geniais). Mais uma vez, O’Connor entende que tudo depende da sincronia entre os dois atores em tela ao mesmo tempo, tudo se resume ao momento, e vemos Affleck e Bernthal mais uma vez dividirem o mesmo plano, agindo em sintonia de movimentos, agora, matando os membros genéricos daquela gangue, com uma encenação que dá um banho em qualquer sequência de ação do primeiro filme. Tudo de bom no longa é deslocado do todo e se resume aos irmãos.

O problema é que O Contador 2 tem pelo menos mais uns três ou quatro núcleos e uma dúzia de personagens genéricos, estando esses muito mais envolvidos na trama de fato e na descoberta a ser feita. Não poderia ser mais protocolar e desleixado, parecendo um amontoado de cenas explicando cada novo passo a seguir, e deixando claro que quando tenta fluir o longa não funciona, principalmente quando adota esse tom mais sério e de urgência, assemelhando-se ao anterior. Por sorte, Affleck e Bernthal não têm destaque na trama, mas são os personagens centrais do filme, e suas interações são tudo que o filme precisa para existir e perceber sua própria ineficiência.

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