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|Crítica| 'Pedro Páramo' (2024) - Dir. Rodrigo Prieto

|Crítica| 'Pedro Páramo' (2024) - Dir. Rodrigo Prieto

Crítica por Victor Russo.

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'Pedro Páramo' / Netflix

 

Título Original: Pedro Páramo (México)
Ano: 2024
Diretor: Rodrigo Prieto
Elenco: Manuel Garcia-Rulfo, Tenoch Huerta Mejía, Dolores Heredia, Ilse Salas e Hector Kotsifakis.
Duração: 130 min.
Nota: 3,0/5,0
 

Sem o deslumbre visual de muitos filmes que fotografou, Rodrigo Prieto tem estreia com bom controle das atuações e domínio da fantasia realista com flertes no terror, mas sem deslanchar totalmente por ficar preso a uma estrutura meio literária

A estreia na direção, no caso, em longas, de diretores de fotografia é sempre instigante de se observar, perceber como esses profissionais que dominam a luz, os movimentos e enquadramentos farão a transição para um posto de controle maior, de não só compor imagens, mas fazer delas o fluxo da narrativa a partir de todos os elementos presentes em um filme. Nesse sentido, Rodrigo Prieto (muito conhecido por trabalhar com Martin Scorsese e no recente Barbie) escolhe iniciar com uma obra pela qual parece muito apaixonado, uma adaptação do livro de Juan Rulfo, que observa transformações no México a partir de um realismo fantástico e a construção de um personagem aos moldes de uma cinebiografia. Prieto deixa então Hollywood, pelo menos em parte, já que se trata de uma produção original Netflix, para retornar ao cinema mexicano e contar uma história bastante própria do imaginário e da cultura do seu país, desde o desenvolvimento histórico a partir de uma pequena cidade, até o lidar com o morrer e os que ficam após a morte, que são parte do folclore literário, cinematográfico e de outras artes no México há muitos anos. 

Entretanto, esse retorno para narrar algo que lhe parece muito caro também impede o longa de deslanchar enquanto cinema, o que soa curioso para alguém que sempre esteve no domínio da imagem cinematográfica e não do texto/roteiro. É uma obra bastante estruturada e narrada a partir de elementos mais literários, do contar histórias ao longo de muitas décadas, com uso constante da narração em off, não como artifício para se criar qualquer jogo cinematográfico, mas preocupada mesmo em contar uma história sobre aquele personagem e lugar para quem chegou depois. Claro que Prieto é competente o suficiente para construir suas imagens, sobretudo a partir do chiaroscuro, em um longa que flerta muito com o fantasmagórico, partindo da chegada de Juan Preciado (Tenoch Huerta Mejía), um falso protagonista que serve de condutor inicial e que é um filho de Pedro Páramo (Manuel Garcia-Rulfo) que nunca conheceu o pai, a uma cidade fantasma e repleta de assombrações, inicialmente dificultando a percepção dele e do público em reconhecer quais interações são com aqueles que ainda estão vivos, e gerando bons momentos de apreensão pela construção desses espaços vazios e escuros. Entretanto, passa longe de ser um filme que se marca por sua imagem, sendo o maior potencial nesse sentido em como filma o verdadeiro protagonista, que dá nome à obra, em planos mais fechados, imponentes e dominadores.

Ainda que a narrativa entre em um lugar mais burocrático após a quase exclusão repentina de Preciado da equação, nessa hora inicial, Prieto consegue criar um controle sem tantas marcações entre o presente fantasioso e o passado narrado, diferenciando ambos em como fotografa criando gêneros completamente diferentes, do terror fantástico para uma falsa cinebiografia ensolarada. É bem verdade que a saída do filho permite ao pai dominar a tela e se construir enquanto uma figura tão detestável quanto interessante, um símbolo do México daquele período e que estabelece relações com o hoje. Ao mesmo tempo, o deslocamento total para os flashbacks deixam de funcionar enquanto narrativa cinematográfica, com uma montagem menos criativa e consolidando mesmo esse lugar da estrutura cinebiográfica mais convencional. Prieto ainda demonstra bastante habilidade em conduzir suas atuações, sobretudo as personagens femininas e suas relações passageiras com essa figura patriarcal, mas o filme vai perdendo modulação, tornando-se um tanto moroso, como se esperasse o final que tarda a chegar ansiosamente, assim como o protagonista que vai perdendo sua força com o tempo que passa e o país que se transforma em seu entorno.

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