|Crítica| 'Planeta dos Macacos: O Reinado' (2024) - Dir. Wes Ball
Crítica por Victor Russo.
'Planeta dos Macacos: O Reinado' / 20th Century Studios
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Ao reforçar o seu lugar como continuação da trilogia anterior, Wes Ball mantém a dinâmica estabelecida por Matt Reeves sob suas próprias regras, mas faz da reconstrução um retrocesso para a franquia.
Diretor de todos os filmes da franquia Maze Runner, Wes Ball se sente confortável ao lidar com um filme de distopia que precisa tirar o seu protagonista da comunidade previamente estabelecida e colocá-lo em constante movimento por um mundo perigoso e praticamente inabitado. Inclusive, por mais que esse convívio inicial seja fabricado em Maze Runner, o tempo que Ball gasta e como ele olha para esse trabalho em equipe a partir de regras pré-estabelecidas e respeitadas como um mantra sagrado é bem semelhante em Planeta dos Macacos: O Reinado. Ao mesmo tempo, o cineasta, ao inicialmente estabelecer conexão com o último filme de Matt Reeves (escolha que provavelmente não partiu dele, mas do estúdio, que planeja mais cinco filmes na franquia), mantém uma certa similaridade de olhar para com aquele mundo e personagens. Não só Caesar segue presente em espírito, tendo seu discurso compreendido ou deturpado, como as dinâmicas que se estabelecem vão bastante em direção ao que já vinha sendo feito, tendo Noa como o novo Caesar, ainda jovem, lutando por justiça e por seu bando, enquanto parte em um jornada com cara de faroeste e encontra parceiros bondosos e uma garota humana que não fala pelo caminho, elementos todos presentes no longa anterior, assim como a escravização da família do protagonista.
Entretanto, ainda que mantenha um grande interesse por explorar o melodrama, sobretudo pelo close-up, algo que Reeves fez como poucos, e tenha essa computação gráfica fotorrealista como sua aliada, Ball tem sua maior força em como lida com esses corpos no espaço, sobretudo em cenas de ação e contemplação. É um longa que se constrói de maneira até bem econômica, já iniciando com as figuras que iremos acompanhar, como foco em Noa, escalando e tentando sobreviver para pegar um ovo, antes de rapidamente um conflito se instalar e sua aldeia ser destruída. Pouco é dito, Ball confia no olhar do espectador para a compreensão de toda a situação, tanto em como a ação tem seu papel importante nesse conflito a ser resolvido, como, principalmente, como ele exibe aquele mundo com um certo fascínio ambíguo, um medo do desconhecido para além das fronteiras demarcadas, mas uma beleza em conhecer mais e mais. É quando o plano se abre e a combinação de efeito prático com computação gráfica cria um embelezamento poderoso desse lugar inabitado, tendo no contato dos personagens com a natureza a harmonia definidora da obra.
É justamente por isso que o filme começa a se enfraquecer quando o discurso verbalizado passa a ter seu lugar de destaque. A deturpação da palavra de Caesar (visto como uma espécie de Jesus pelos macacos sobreviventes e evoluídos) pelo novo bando até surte efeito em como esse fanatismo religioso é representado visualmente, por meio de máscaras e aparatos tecnológicos para dominação, além da multidão que vai sendo domada e convertida aos poucos. Entretanto, Ball parece de mãos atadas, é um filme que não se resolve ou não se dedica ao que cria justamente porque precisar servir como o começo de uma nova era, o primeiro de novos cinco filmes da franquia para a Disney. Dessa forma, soa contraditória a escolha em manter Caesar e os filmes anteriores tão presentes, a partir do momento em que esse filme-restabelecimento apenas se usa desses conceitos para estabelecer o bando vilão da vez e para se posicionar temporal e espacialmente, mas, na prática, o real interesse, aqui majoritariamente representado por Mae (Freya Allan), está nessa desculpa de reconstrução pelos humanos que nada mais é do que um retrocesso para algo semelhante ao início da última trilogia, um conflito entre humanos e macacos, em que os seres humanos acreditam que aquele mundo pertence a eles e por isso devem subjugar qualquer poder que não o deles. Tal abordagem até faria sentido em um reboot, já que é um conflito que está no cerne da franquia, o que enfraquece esse olhar comercial é justamente a atenção que o longa vai dar para uma trilogia que estava fechada. O filme caminha bem quando pode assim fazer, mas, no final, ele é apenas uma peça pequena em um grande tabuleiro que não tem novas ideias e prefere andar em círculos, seguindo os passos de tudo aquilo que a gente já viu aos montes.