|Crítica| 'Godzilla e Kong: O Novo Império' (2024) - Dir. Adam Wingard
Crítica por Victor Russo.
"Godzilla e Kong: O Novo Império' / Warner Bros.
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Adam Wingard transforma o universo em um grande video game e se diverte no processo, mas ainda é amarrado pela necessidade do estúdio em expandir a mitologia
Efeitos digitais coloridos, que rompem em grande medida com o “realismo” mais acinzentado do CGI dominante no blockbuster atual, Kong com um braço supersônico, Godzilla rosa de tanta radiação, um vilão primata malvado vermelho e que escraviza seus semelhantes em um poço de lava, a briga gorila x macaco e lagarto radioativo x lagarto de gelo, uma borboleta mágica esperando para ser despertada por um povo escondido no núcleo da terra (Terra Oca). Esses e tantos outros elementos só reforçam a guinada que Wingard (em seu segundo filme na franquia) rumo a uma narrativa cada vez mais descompromissada, que busca uma diversão que se assemelha aos games, tanto no gráfico, quanto na inserção de elementos divertidinhos, como o braço do Kong ou a evolução do Godzilla, que são típicos dos aprimoramentos de personagens em jogos de video game. Tal escolha menos séria faz bem à franquia e ao filme, tira um peso maior no núcleo dramático humano e tem desde a sequência inicial, do Kong lutando contra seres da Terra Oca, um foco maior no que esses filmes realmente tem para oferecer: monstros gigantes lutando.
Assim, Godzilla e Kong: O Novo Império parece entender melhor do que seus predecessores que o potencial desse universo está na ação, na emoção da grandiosidade de vermos titãs lutando, na recusa a uma seriedade que encontra na superficialidade uma emoção muito mais genuína. Wingard tem uma visão e escolhas interessantes o suficiente para dar essa guinada rumo à fantasia. Entretanto, isso não se concretiza totalmente por duas limitações muito mais impostas pela dinâmica de estúdio do que necessariamente pelo cineasta, que deve ter pouco controle a um corte final da obra. A primeira é recorrente nos filmes da franquia e aparece até amenizada aqui. A necessidade de expandir a mitologia do universo faz dos seres humanos meros explicadores (todos), alívios cômicos (Bryan Tyree Henry e Dan Stevens) e artifícios melodramáticos (Rebecca Hall e Kaylee Hottle). A segunda já é uma limitação de técnica/produção, na dificuldade desse CGI mais industrial em transpor ideias e conceitos para a tela.
Assim, somos ainda conduzidos por esses personagens humanos, ainda que esse longa constantemente os abandone para focar na ação de monstros gigantes, o que é um alívio. Mas, de qualquer forma, essas relações presentes nos longas anteriores seguem sendo o fio condutor para a expansão dessa mitologia, agora adentrando uma civilização escondida na Terra Oca. Entretanto, não só esse avanço da história é desinteressante e cada vez mais protocolar, como o fascínio por aquele mundo e até mesmo a diversão pela pancadaria são incapazes de atingir os conceitos totais propostos por Wingard. Isso porque, se o cineasta busca na cor e nos planos abertos uma forma de endeusar a grandiosidade desses titãs e, ao mesmo tempo, retratar um mundo rico e perigoso, na prática, essa dominação total dos efeitos digitais não consegue dar profundidade à imagem, deixando-nos restritos a planos com poucas coisas em foco ou meio chapados, sobretudo nas sequências de ação.
Godzilla e Kong: O Novo Império até ruma para um caminho interessante, mas ainda é bastante impossibilitado de ser essa diversão completa e entregue que o seu cineasta busca. A imagem é quem mais sofre no processo, deixando um gosto agridoce dos conceitos que não conseguem atingir todo o seu potencial.