Português (Brasil)

|Crítica| 'Saudosa Maloca' (2024) - Dir. Pedro Serrano

|Crítica| 'Saudosa Maloca' (2024) - Dir. Pedro Serrano

Crítica por Victor Russo.

Compartilhe este conteúdo:

 

Imagem Principal

'Saudosa Maloca' / ELO Studios

 

Título Original: Saudosa Maloca (Brasil)
Ano: 2024
Diretor: Pedro Serrano
Elenco : Paulo Miklos, Gero Camilo, Leilah Moreno, Gustavo Machado, e Paulo Teifenthaler.
Duração: 100 min.
Nota: 3,5/5,0
 

Pedro Serrano rejeita as tendências cinebiográficas e faz da música que dá título ao filme o dispositivo para um lugar aconchegante e apaixonado

Não é novidade o fascínio de Serrano por Adoniran Barbosa. Hoje em seu terceiro filme e segundo longa-metragem, todos foram dedicados a ele, um dos maiores ícones do samba brasileiro. Depois de iniciar a carreira com um curta e três anos depois realizar um documentário, Serrano finalmente chega, quase uma década depois, ao seu primeiro longa ficcional sobre Adoniran, trazendo de volta o mesmo elenco da sua primeira obra, tendo Paulo Miklos vivendo o protagonista. Talvez o filme documental cinco anos antes seja fundamental para a liberdade de Serrano em relação às amarras da cinebiografia, que o Brasil importou há anos dos Estados Unidos com todas as principais e mais cansativas batidas do gênero. Serrano não rejeita completamente a ideia de um olhar apaixonado que homenageia Adoniran, mas está longe de se preocupar com um fidelidade restritiva e passagens da vida da pessoa real como uma página de Wikipédia, que salta entre eventos mais conhecidos e importantes.

A escolha pela música “Saudosa Maloca” é essencial para toda essa abordagem. Serrano consegue assim encontrar um meio do caminho entre o filme sobre música (como “Faroeste Caboclo”, “Eduardo e Mônica” e afins) e a cinebiografia. No final, não se restringe em nenhum dos dois lados, usando-se da canção como uma base para a narrativa, que vai ser sedimentada a partir de uma visão que se aproxima muito mais da fantasia do que da realidade. “Saudosa Maloca” vira acima de tudo um espaço, uma ambientação que vai além da casa, mas se expande para a região próxima e para as pessoas que cruzam o caminho dos três personagens principais. Ela é palco para a boêmia, para uma leveza otimista desses personagens pobres que não tiram o sorriso do rosto e só querem cantar, dançar e beber. Ao fazer isso, Serrano não segue a letra passo a passo, mas insere a sua própria versão do Adoniran naquele contexto, trazendo mais do que uma pessoa real, um mito que é encarado como mito, aproximando o cineasta do garoto mais jovem no futuro que tem no mestre do samba uma figura quase super humana. 

Assim, mesmo quando o longa cai para algumas simplificações ou caricaturas, como o jeito de falar que Miklos dá ao personagem, não há ainda aquela necessidade de fidedignidade com o real. Parece mais uma brincadeira com essa versão abertamente ficcional da pessoa real, inserida em um contexto fantástico de sua própria música, pelo olhar de alguém que venera de longe, mesmo querendo e tentando estar o mais próximo possível. Se “Saudosa Maloca” diverte ao acompanharmos as trapalhadas diárias daqueles personagens e emociona no tom final de reverência à Adoniran, tudo isso acontece justamente pela mão de um cineasta que rejeita a restrição do gênero em prol de uma contação de história por meio de uma linguagem audiovisual mais leve e inocente. Mais do que a exaltação de alguém que aprecia a figura, suas histórias e tudo que rondou sua vida em um momento específico de São Paulo, Serrano tem uma paixão por aquela realidade que foi passada adiante e se transformou em um conto de fadas urbano, em que as dificuldades da verdade são facilmente superáveis pela paixão da boêmia. O cineasta pode não ter chegado ainda em um momento de maturidade do seu cinema, mas talvez seja justamente isso que faça de “Saudosa Maloca” tão delicioso, essa beleza pela simplicidade mais genuína que rejeita a rigidez de uma “fórmula de sucesso”.

Compartilhe este conteúdo: