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|Crítica| 'Softie' (2023) - Dir. Samuel Theis

|Crítica| 'Softie' (2023) - Dir. Samuel Theis

Crítica por Victor Russo.

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'Softie' / Pandora Filmes

 

Título Original: Petite Nature (Frabça)
Ano: 2023
Diretor: Samuel Theis
Elenco : Aliocha Reinert, Antoine Reinartz, Izïa Higelin e Mélissa Olexa.
Duração: 93 min.
Nota: 3,0/5,0

 

Samuel Theis tenta subverter os filmes com relações próximas entre professor e aluno ao retardar a entrada no tema e mudar o ponto de vista, ainda que tal proposta só surta efeito verdadeiramente na rejeição ao punitivismo

O filme se inicia e já nos coloca a par da condição financeira e familiar de Johnny (Aliocha Reinert), filmando primeiro o protagonista de perto para apenas depois revelar sua irmã e sua mãe também carregando o pouco que eles têm nessa mudança desesperada. Até meio ingenuamente, Theis vai fazer questão de reforçar essa situação ao fazer o menino ser zombado pelos amigos de escola que não são ricos, mas são certamente mais abastados que ele. Com sua mãe tendo que cruzar a fronteira diariamente para trabalhar em outro país, resta à Johnny não só a obrigação de cuidar da irmã e defendê-la do mundo, como também esse desenvolvimento precoce não intencional, a perda da infância pela necessidade de virar adulto antes mesmo da adolescência. Começo citando todo esse contexto inicial não a fim de criar uma sinopse do longa, e, sim, como uma maneira de mostrar que, apesar da curta duração (apenas 90 minutos), “Softie” nos engana durante boa parte da sua projeção, não revelando seu real propósito, ainda que toda a construção social do protagonista tenha alguma importância para o todo. 

Jean (Antoine Reinartz) até tem sua primeira aparição com certa relevância bem cedo, mas qualquer sugestão nos primeiros minutos de algum tipo de proximidade entre ele e Johnny parece nada além daquele professor que reconhece o talento em um aluno sem muitas condições financeiras e faz de tudo para ajudá-lo a crescer na vida. Por algum tempo, o longa até nos engana sugerindo que vai por esse caminho, antes de, até de forma bem abrupta, revelar seu verdadeiro (ou pelo menos maior) interesse, com o protagonista sendo ludibriado não intencionalmente a por em ação os seus sentimentos confusos e demonstrá-los diante do seu professor. Se reforço o fato de Johnny ser o protagonista, isso se dá em razão das poucas escolhas que o longa tenta realmente fugir um pouco desse padrão de filmes que já vimos tantas vezes. Seja talvez no caso mais famoso, “A Caça” (2012), ou no mais recente que tenho conhecimento, “Ervas Secas” (2023), geralmente esse tipo de filme que parte de uma criança se apaixonando por seu professor, não sendo correspondida e respondendo por birra criando uma grande bola de neve em que o professor é visto como pedófilo, tem como ponto de vista condutor da narrativa o adulto que sofrerá a consequência dos atos. De certa forma, essas obras até costumam olhar com um tom meio incriminatório para as crianças, a partir do momento em que observamos o desespero e sofrimento de quem é atingido por tudo aquilo, seja envolto em um thriller, como no longa dinamarquês, ou de forma menos avassaladora e com focos múltiplos, como no turco. 

Theis escolhe o caminho, não inovador, mas menos usual, de abaixar a câmera até a altura de Johnny e torná-lo o nosso objeto de interesse, o que, por mais que pareça uma mudança inofensiva, é eficiente ao criar uma ambiguidade maior de sentimento no espectador. O garoto continua tendo uma atitude errada e nunca vemos o professor como um vilão, porém, todo o contexto criado por acompanharmos o dia a dia do protagonista faz com que empatizemos mais com ele e esperemos por uma resolução que não seja realmente prejudicial para nenhuma das partes. Nesse sentido, o cineasta vai por um caminho ainda menos comum, a partir do momento em que não busca nenhum tipo de punitivismo, sobretudo em relação ao professor, ainda que, ao final, tal escolha mais subversiva que evita o choque resulte em um final meio morno, assim como todo o filme.

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