Português (Brasil)

|Crítica| 'Uma Noite em Haifa' (2023) - Dir. Amos Gitaï

|Crítica| 'Uma Noite em Haifa' (2023) - Dir. Amos Gitaï

Crítica por Raissa Ferreira.

Compartilhe este conteúdo:

 

'Uma Noite em Haifa' / Synapse Distribution

 

Título Original: Laila in Haifa (Israel)
Ano: 2023
Diretor:  Amos Gitaï
Elenco : Maria Zreik, Naama Preis, Tsahi Halevi, Makram J. Khoury e Bahira Ablassi.
Duração: 99 min.
Nota: 2,0/5,0
 

Com uma mise-en-scène que destaca os diálogos, sempre com algum teor político, o novo trabalho de Amos Gitaï se torna cansativo por um texto que não acompanha a habilidade técnica

Ao adentrar nessa noite em Haifa, acompanhamos o jogo de câmera de Gitaï passeando pela rua escura e depois em cada espaço da boate que será a peça central do longa, trata-se de um pequeno mundo criado para ser observado, como uma amostra de conflitos reais do verdadeiro, e maior, universo em que vivemos. É inegável o domínio do diretor ao filmar essas pessoas e o ambiente que as cerca, criando o próprio prédio como o protagonista da obra, enquanto os personagens são apenas acessórios que servem para provar seus pontos sobre os encontros nesse local que abriga muita diversidade no meio de tantos atritos. Há um alongamento do tempo, usando planos-sequência seguidos que se unem por pequenos respiros apenas, toda encenação do filme aponta para os diálogos, usando tudo para destacar momentos de interação entre duas pessoas que provocarão reflexões políticas, seja sobre a situação entre Palestina e Israel ou sobre uma opressão ao gênero feminino, salientada pelo leve destaque que se dá às personagens mulheres e seus embates com os homens do longa. Ocorre que, ao voltar toda sua mise-en-scène para fazer esse texto ser o grande foco, Gitaï confia demais que tanto os diálogos, quanto seus atores, sejam capazes de sustentar essa atenção que é dada. Isso, infelizmente, não acontece. 

Ainda que existam personagens centrais na narrativa, e todas se encontrem em algum momento e digam algo umas às outras, a dinâmica do olhar que o diretor propõe cria um distanciamento para elas, tornando seu conjunto muito mais importante que a individualidade de cada uma. Então, quando tudo se volta para observarmos uma interação entre duas peças dessa boate, o texto é essencial para segurar a relação do espectador com esse pequeno universo criado por Gitaï. Mas há muita complexidade nos temas, como por exemplo, colocar uma mulher israelense e outra palestina sentadas num balcão de bar falando sobre suas vivências de cada lado do conflito, e o diálogo entre elas acaba reduzindo o debate, com frases de efeito rasas que não são nem de perto suficientes para propor essa reflexão política que o longa está claramente tão interessado em fazer. Outro problema é que, ao colocar duas atrizes para conversar como única base que segura um longo plano, em uma obra que já trabalha com um prolongamento do tempo, é necessário que a dinâmica entre as duas seja boa o suficiente para garantir não apenas o interesse no que é dito, quanto realçar suas palavras, valorizando o texto. Então, o que já não parecia bom o bastante se torna ainda mais exaustivo, já que alguns atores e atrizes deixam a desejar nessa entrega e em pouco tempo, cada interação se torna mais desinteressante e esvaziada de sentido.

Ainda que muitas vezes todos os elementos do filme apelem para alguma emoção específica, em um conjunto de trilha sonora, iluminação e closes nos personagens, esse combo da atuação com o texto não é capaz de puxar os mesmos sentimentos. É dificílimo conectar tudo que o longa faz, visualmente e sonoramente, com seu conteúdo. Como é algo baseado em encontros, os humanos são importantes para estabelecer relações que gerem os questionamentos aqui colocados, e “Uma Noite em Haifa” só brilha, realmente, nos momentos em que essas pessoas estão quietas, sendo observadas fluindo com a câmera e o espaço, com uma música alta, aumentada para fora da diegese. 

Como exercício de contemplação de pessoas existindo e compartilhando um espaço, por mais diferentes que sejam, a obra até poderia funcionar, principalmente pela habilidade do diretor em certos pontos, mas ele faz questão de focar em tudo que é dito, que é justamente sua maior fraqueza.

 

 

Compartilhe este conteúdo: