|Crítica| 'Um Filho' (2022) - Dir. Florian Zeller
Crítica por Victor Russo.
'Um Filho' / Diamond Films
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Com uma abordagem bem convencional, “Um Filho” tenta replicar a estrutura do seu predecessor, mas perde força ao não definir um ponto de vista
É comum diretores estrearem com filmes arrebatadores e terem todos os olhares voltados para sua obra seguinte. No caso de Florian Zeller, a surpresa foi ainda maior por se tratar de um dramaturgo adaptando a sua própria peça para o cinema, transição de linguagem que não raramente é mal sucedida. Então, quando “Um Filho”, adaptação da segunda peça de uma trilogia do diretor (na qual, “Meu Pai” é a primeira), foi anunciado no Festival de Toronto do ano passado, muita confiança era depositada no que viria a seguir na carreira cinematográfica de Zeller.
Entretanto, o resultado é frustrante a ponto de não reconhecermos o mesmo diretor do predecessor aqui. Dotado de uma criatividade e sensibilidade em “Meu Pai”, a sequência (que não é sequência) é tão tradicional em tudo que se propõe a ponto de soar retrógrada. A difícil discussão sobre a demência do protagonista no primeiro filme é substituída por uma abordagem nada sutil e extremamente verborrágica sobre a depressão do garoto. Apesar de Hugh Jackman conseguir nos convencer sobre a dualidade de seu personagem (por uma lado, amoroso e preocupado com o filho. Por outro, deixou o garoto quando pequeno e agora é incapaz de entendê-lo), Zeller o coloca na posição ingrata de ser quase um personagem-exposição, daqueles que funcionam menos como um ser de carne e osso e mais como um grito sobre o que a obra quer dizer. Chega a ser constrangedor a forma como o filme o diminui a uma incapacidade extrema de perceber a depressão do filho, e ainda mais problemático como o longa o obriga a falar sobre o seu medo de virar aquilo que o seu pai foi com ele, isso logo após uma sequência em que o seu pai (Anthony Hopkins) aparece apenas com essa mesma finalidade.
E se comparo esse com o seu predecessor é porque há aqui uma replicação da estrutura, o que faz sentido, pois ambos são adaptações do teatro, onde as elipses para explorar apenas momentos específicos sem uma continuidade narrativa tão grande é muito mais comum. Porém, se tal estrutura funcionava no primeiro era justamente por vermos tudo pelos olhos e mente de seu protagonista, em uma série de momentos confusos espaço-temporalmente. Já “Um Filho”, fragiliza essa narrativa ao não adotar um ponto de vista único. Claro, o pai é o protagonista e o filme tem um foco muito maior em como ele reage ao descobrir a depressão do filho e se sentir incapaz de ajudá-lo. O problema é que o filho também ganha, esporadicamente, um ponto de vista dentro do longa, seja sozinho ou interagindo com a madrasta (Vanessa Kirby). Essa inconsistência do olhar que acompanhamos faz com que o longa soe ainda mais como uma exposição temática meio genérica (o que não diminui a importância do tema, óbvio). É como se ele só acompanhasse o olhar do filho quando tivesse alguma mensagem para passar e não soubesse como fazer isso acompanhando apenas o seu real objeto de interesse: o personagem de Jackman.
Assim, o longa não consegue ser tão efetivo em nenhuma das três ideias que tenta passar. Não funciona como a dor de alguém próximo que vê aquilo de fora. Menos ainda como quem está sofrendo aquilo. E ainda menos ao tentar fazer a abordagem mais genérica e geral, como uma visão de toda aquela situação e os seus afetados. Com isso, sobram alguns momentos genuínos, como pai e filho dançando e parecendo esquecer de tudo por alguns segundos. É uma pena que tais momentos nunca conseguem solidificar essa narrativa indecisa.