|Crítica| 'Redenção' (2021) - Dir. Icíar Bollaín
Crítica por Victor Russo.
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'Redenção' / Pandora Filmes
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Debate sobre culpa e perdão de Icíar Bollaín, ainda que bastante engessado, sabe parar tudo para os diálogos rodeados por silêncios tomarem conta
Redenção, filme espanhol da diretora Icíar Bollaín que chega com três anos de atraso no Brasil, é bastante direto no que deseja falar, complexificando (mas nem tanto) um debate sobre as ações e suas consequências, sobre o arrependimento e a culpa, e o perdoar ou não. Ou melhor, é claro em seu objetivo após uma espécie de prólogo bastante confuso, em que seguimos os assassinos de Juan Maria Jauregi cometendo um atentado até escaparem ilesos, ao mesmo tempo que nos é mostrado a esposa Maixabel (Blanca Portillo) e a filha Maria (Maria Cerezuela) recebendo a notícia da perda. Entretanto, uma montagem um tanto estranha pula disso para os terroristas sendo julgados anos depois, e, em seguida, salta mais alguns anos novamente para retratar todos bem mais velhos, Maixabel e Maria levando suas vidas, sem deixar de carregar o peso da perda de Juan, enquanto Ibon (Luis Tosar) e Luis (Urko Olazábal) convivem na mesma prisão, fazendo parte de um grupo de ex-integrantes da ETA (grupo separacionista do País Basco que cometeu uma série de atentados, registrando quase mil assassinados reconhecidos, até se desmilitarizar em 2011) que se arrependeu de seus crimes e culpa a organização pelos atentados. É só nesse momento que Bollaín chega onde realmente deseja e se permite meditar sobre as questões a serem discutidas pela obra.
Dizer que o longa não tem alguns momentos mais apelativos, como Maixabel vendo pela televisão o anúncio da ETA deixando de ter um braço armado, seria um tanto ingênuo, assim como, é fácil sentir que o filme segue uma certa padronização de filmes europeus que lidam com traumas sociais e históricos. É uma obra que tem dificuldade de se desenvolver, sobretudo por sempre perder o fôlego com personagens secundários, que parecem existir só para cumprir determinados papéis, sendo Maria a mais prejudicada no processo pela falta de desenvolvimento. Tudo isso é parte de um projeto que tem desvios e barreiras para alcançar os três momentos que realmente têm força, as três cenas que extrai tudo que Bollaín deseja apresentar em tela: os encontros de Maixabel com Luis primeiro e Ibon depois, e a ida de Maixabel e Ibon até o túmulo de Juan, cercados por todos os familiares e amigos que demoram a aceitar a presença do assassino que tanto destruiu aquelas pessoas.
São esses três momentos, sobretudo o encontro de Maixabel e Ibon para falar sobre o passado, o acontecido e tudo que envolveu a entrada dele na ETA e sua percepção do que cometeu, que justificam o filme. Mais do que isso, que encontram a potência dramática que ele tanto clama. Tais cenas são dominadas por uma maturidade simples de Bollaín, que percebe a não necessidade de apelar para recursos manipulativos, como a trilha sonora, para impactar o espectador. Tudo se resume ao básico plano e contraplano, com a câmera se aproximando dos rostos dos atores a partir do momento que se intensifica a conversa e os sentimentos-pilares do longa. O silêncio ao fundo, restando apenas alguns sons ambientes, é uma compreensão da cineasta de que tudo se resume a um debate aberto, sem resposta certa, em que cada vítima ou assassino arrependido vai lidar com seus sentimentos de uma forma distinta, e o que importa é justamente o conversar. Ou seja, se tudo para, inclusive a trilha sonora, é porque o falar e o ouvir são as únicas coisas que movem todo o debate proposto pela obra. Resume-se, então, a texto, atuação e simples enquadramentos, o básico para compreender uma potência dramática de sentimentos conflitantes e mais de 20 anos de dores se acumulando. Há uma maturidade também em não simplesmente isentar Luis e Ibon de seus atos, mas de tentar entender, ou ao menos conversar, sobre como perceber o depois, o lidar com as marcas que já ficaram, só que vislumbrar um seguir em frente.