Português (Brasil)

|Crítica| 'Pearl' (2022) - Dir. Ti West

|Crítica| 'Pearl' (2022) - Dir. Ti West

Crítica por Victor Russo.

Compartilhe este conteúdo:

'Pearl' / Cinecolor Films Brasil

 

Título Original: Pearl (EUA)
Ano: 2022
Diretor: Ti West
Elenco : Mia Goth, David Corenswet, Tandi Wright, Matthew Sunderland e Emma Jenkins-Purro.
Duração: 102 min.
Nota: 4,0/5,0
 

Sem a necessidade de estabelecer as regras de uma nova franquia slasher, “Pearl” direciona a sua atenção para a performance

Desde a sequência inicial, vemos Pearl (Mia Goth) por diversos espelhos, enquanto faz movimentos de dança ao som de uma música que não sabemos se faz parte daquele mundo ou está apenas na cabeça da protagonista. Porém, poucos segundos depois, a música para e a personagem é firmemente repreendida pela mãe, que a recorda dos fazeres da fazenda. É a realidade batendo à porta, ainda que nunca tenhamos certeza do que podemos acreditar ou não.

Em seguida, somos apresentados a um novo traço da personalidade de Pearl, quando com um forcado (provavelmente o mesmo usando em “X”) ela mata o ganso que interrompe sua nova performance e o entrega de bandeja ao crocodilo do rio. Tais referências ao filme original nos lembram de que “Pearl” é um prequel, e, portanto, é um olhar do passado que se liga a um futuro já construído. Então, claro, sabemos quem a personagem principal se tornará, voltando nosso interesse para como ela se virou aquela pessoa e como os seus sonhos foram frustrados.

Entretanto, se as referências nos recordam ao que se refere a existência básica de “Pearl”, um predecessor, ele não poderia ser mais diferente de “X” em todos os aspectos fílmicos imagináveis. O que é curioso, porque o mesmo TI West dirige ambos os filmes, mas a impressão é a de dois realizadores diferentes.

Se “X” tinha no slasher o seu norte e lidava com o gênero com reverência e subversão, em alguns momentos até se colocando em uma posição de superioridade, com medo de sujar as mãos e recorrendo a uma estilização mais pomposa na hora das mortes, “Pearl” até continua fazendo parte desse subgênero do horror, mas sua perspectiva é muito diferente. Todo o seu interesse se volta para a performance, para os movimentos. É um conto de fadas sombrio sob o olhar perturbado de uma princesa fadada à infelicidade e ao mundano. É justamente essa vida “comum” que mais aterroriza a personagem, o que torna o seu final trágico.

Tal mudança fica perceptível quando percebemos o ponto de vista que cada filme adquire na hora de narrar suas histórias. “X” seguia a abordagem mais tradicional de um slasher, os múltiplos pontos de vista, permitindo assim que acompanhássemos cada personagem em lugares diferentes como uma possível presa para os assassinos. Além disso, a própria maneira de seguir cada um desses personagens era distinta, usando-se bastante não só da visão onisciente da câmera de West, como também da câmera presente na diegese, do filme pornô que estavam realizando (posteriormente se transformando em uma espécie de found footage).

Nessa prequela, Pearl é o nosso olhar o tempo todo. Isso não só muda a dinâmica, a partir do momento que acompanhamos a serial killer, como, principalmente, faz o público se questionar sobre a realidade daqueles acontecimentos. A protagonista vive em um mundo à parte, que só existe daquela forma em sua mente e em seus sonhos. Assim, West não tem o menor interesse em revelar o que é realidade. Tudo é filmado sob a lente de um conto de fadas. A luz que entra pela janela é de um azul artificial, as cores do mundo são vibrantes como não são no nosso mundo. O próprio monólogo extremamente revelador sobre a psicologia da personagem parece ausente de realidade, já que mais uma vez somos levados para extremamente próximo dela.

É sob essa lógica que vemos Pearl performando sua própria vida, vivendo o mundo real com o seu olhar sonhador. O interesse pelo real se perde, até as mortes adquirem um novo caráter por serem uma reação àquilo que entendemos da personagem. E, assim como a protagonista vê o mundo como um sonho constante, West traduz essa mesma beleza quase surrealista para o ato de matar. Ele até continua sendo um interesse do longa, como acontece nos slashers, mas o público está menos do lado das vítimas e mais hipnotizado pelo poder performático de Mia Goth. É como se West nos tornasse cúmplices dela e de sua percepção de mundo, quase nos forçando a encontrar beleza em cada um daqueles atos cruéis.

Compartilhe este conteúdo: