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|Crítica| 'Os Rejeitados' (2024) - Dir. Alexander Payne

|Crítica| 'Os Rejeitados' (2024) - Dir. Alexander Payne

Crítica por Victor Russo.

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'Os Rejeitados' / Universal Pictures

 

Título Original: The Holdovers (EUA)
Ano: 2024
Diretor Alexander Payne
Elenco : Paul Giamatti, Dominic Sessa, Da'Vine Joy Randolph, Carrie Preston e Brady Hepner.
Duração: 133 min.
Nota: 3,5/5,0
 

Ainda que sem se livrar de “momentos de Oscar” mais marcados, Alexander Payne fortalece a sua tragicomédia com a simplicidade emocional e formal

"Os Rejeitados” chega em uma época do ano e com uma carga de indicações que torna quase impossível para qualquer crítico ou espectador já não associar automaticamente o filme às premiações hollywoodianas, sobretudo ao Oscar. Fazê-lo não é uma limitação, pelo contrário, é um entendimento natural que determinadas obras são pensadas e lançadas em um momento específico (Festival de Veneza, Toronto ou Nova York) como uma estratégia de se aproximar das premiações e obter o seu ganho a partir do interesse por conta das indicações. Da mesma forma que as produções da Marvel, os filmes de terror da A24 ou as comédias românticas da Netflix (só para citar três entre tantos exemplos possíveis) possuem uma fórmula, é inevitável que os longas que visam o Oscar também terão, principalmente os lançados nesse período, que tem como objetivo comercial surfar na onda da premiação da Academia, que está em queda, mas ainda atrai muito interesse e é economicamente rentável para essas obras a longo prazo (como em vendas futuras de direitos para streamings, aluguel digital etc). Porém, dizer isso, muitas vezes sob o termo “Oscar Bait”, o qual prefiro usar mais quando uma produção parece totalmente calculada para o Oscar, não exclui a presença do autor na feitura da obra. Entender essa dinâmica da indústria também é importante para nos ajudar a perceber como determinados cineastas conseguem destacar uma voz mais artisticamente pessoal mesmo dentro de um sistema pré-programado (o que não é muito diferente, por exemplo, do que alguns cineastas, como James Cameron, Matt Reeves, James Gunn, Christopher Mcquarrie e Chad Stahelski, são capazes de fazer dentro da dinâmica do blockbuster). Nesse sentido, Alexander Payne viveu desde sempre dentro desse sistema, sendo alguém bem querido pela Academia, mas, quase sempre, não abrindo mão de um estilo muito pessoal, que agrada o Oscar sem ser totalmente moldado e definido pela premiação.

Payne rejeita então uma estética mais chamativa, muito comum recentemente em cineastas que buscam o Oscar e ser chamado de autor a qualquer custo (Bradley Cooper em Maestro é o caso mais recente). Há uma certa humildade em sua direção, uma simplicidade que o faz passar quase despercebido, enquanto o texto, a história e os atores se destacam (aqui, apesar do destaque em premiações para os ótimos Paul Giamatti e Da’Vine Joy Randolph, há que se fazer uma menção para o ótimo novato Dominic Sessa). Payne retorna a um certo classicismo do cinema hollywoodiano, sem grandes extravagâncias, com uma decupagem mais pensa em planos estáticos e que fazem a montagem passar despercebida, com algumas poucas exceções (a apresentação do protagonista com cortes que vão aproximando a câmera dele, um momento em que ele chama o garoto do lado de fora da escola e um corte cria uma piada reforçando o isolamento espacial e os distanciamento sonoro, entre alguns poucos outros momentos). No geral, Payne vai moldar sua tragicomédia pelo estabelecimento espacial seguido pelo que há de mais convencional no cinema clássico, o plano e contraplano. Faz total sentido, já que ele vai olhar acima de tudo para aqueles seres humanos esquecidos no mundo e que encontram nessa difícil aproximação emocional um ponto de conexão muito especial. 

Então, mesmo sem o virtuosismo mais chamativo, Payne vai conduzir calculadamente essa experiência de mais de duas horas, não só em como dirige os atores e insere cada elemento da narrativa, mas, sobretudo, em como vai criar essa tragicomédia por meio de momentos, com uma naturalidade muito grande ao passar da comédia mais direta para o melodrama mais profundo, permeando a obra com um rídiculo meio brega, que é muito mais um elogio do que uma crítica pela doçura tangível, mas inexplicável, com que Payne vê seus personagens. Eles são idealizações dos rejeitados que vão se tornando mais humanos a partir das interações, entre eles e com terceiros. Talvez, o melhor exemplo disso seja mais uma vez o personagem de Sessa, que ao mesmo tempo que não é popular na escola, bate de frente com o principal bully, fazendo este se sentir intimidado e envergonhado constantemente.

É claro que, no processo de amadurecimento dos seus personagens, Payne não consegue abrir mão das convenções mais oscarizáveis. Então, se “Os Rejeitados” como unidade não é um Oscar Bait, há momentos específicos que o são, e quem mais sofre nesse sentido é a personagem de Randolph, que acaba por ser a típica indicação para Atriz Coadjuvante. Por mais que a atuação seja boa o suficiente para segurar a carga cômica e emocional, ela se vê servindo como muleta para a relação principal entre aluno e professor. Quanto mais o longa se afunila nos dois, mais Randolph desaparece, restando a ela apenas chorar pelo filho perdido, sendo o ápice disso a cena da cozinha na festa, completamente marcada para a explosão emocional da atriz que espera inicialmente de costas, antes de virar e começar o show, em um corte que certamente será usado no Oscar para ressaltar a atuação da atriz. Por sorte, tais momentos mais evidentemente desenhados são raros e Payne faz “Os Rejeitados” fluir bem, enquanto acalenta os nossos corações pela simplicidade profunda.

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