|Crítica| 'Nyad' (2023) - Dir. Elizabeth Chai Vasarhelyi & Jimmy Chin
Crítica por Victor Russo.
'Nyad' / Netflix
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Nyad flerta com o documentário e até com a comédia, mas, no fim, pouco tenta fazer para além do padrão estético do Oscar bait de superação
Conhecidos por documentários de superação, quase sempre envolvendo esportes, adrenalina e feitos impossíveis, como o vencedor do Oscar “Free Solo” e “O Resgate”, sobre o time de futebol de garotos presos em uma caverna na Tailândia, Elizabeth Chai Vasarhelyi e Jimmy Chin fazem uma transição para o ficcional sem abandonar o tipo de história real que os motivam. Dessa vez, o objeto de análise é Diana Nyad, maratonista aquática de feitos incríveis que se desafiou repetidas vezes até conseguir, aos 65 anos de idade, ser a primeira pessoa a nadar de Cuba até a Flórida sem uma gaiola de tubarão, um trajeto de mais de 160 quilômetros e 60 horas no mar sem pausas.
Todavia, se a história real que motiva o longa se assemelha ao lugar mais confortável de Elizabeth e Jimmy, a abordagem formal do longa pouco tem a ver com o que os cineastas fizeram até então. É bem verdade que o uso de recortes de jornais televisivos como forma de explicações e exaltação dos feitos de Nyad (Annette Benning) ou a relação mais íntima e obsessiva dela para com o desafio a sua frente até lembram o discurso documental que os cineastas tanto dominam. Só que isso pouco se destaca dentro do padrão estético pronto do novo filme da Netflix, um Oscar bait de superação sem tirar nem pôr. É como se os cineastas até colocassem a cabeça para fora da água em um momento ou outro e dissessem “estamos aqui”, mas a dominância da obra fosse um desenvolvimento com pouquíssima personalidade, aquele filme feito para as atrizes serem indicadas à premiação da Academia estadunidense. No caso, Benning e Jodie Foster.
O projeto parece tão encomendado que até a fotografia do ótimo Claudio Miranda, com exceção de alguns planos mais abertos do trajeto no escuro com luzes vermelhas criando uma mística para o nado, soa quase novelesca, com aquela luz branca que não deixa sombras e um CGI não propositalmente evidente. Mesmo os enquadramentos não só são pouco inventivos como, principalmente, soam protocolares, a ponto de destacar as atrizes apenas em momentos de frases de efeitos ou discussões mais acirradas, aquelas cenas em que o Oscar ama colocar na premiação para reforçar o feito mais chamativo da atriz indicada. Pior ainda fica quando os cineastas recorrem a alguns flashes do passado da protagonista, como se ela tivesse essa epifania e lembrasse o seu destino sempre que estivesse em um momento de dificuldade embaixo d’água. Mais uma vez, a falta de uma proposta estética mais interessante se destaca, e o que vemos é aquele passado tomado por um amarelado com sons abafados, quase gritando para o público o óbvio: que aquilo é uma memória.
Dessa forma, o que resta é mesmo a história real, interessante por si só, e essas duas grandes atrizes, além da boa participação de Rhys Ifans, que mesmo no piloto automático nunca deixam a obra se tornar completamente desinteressante. Sobretudo Foster, até nos momentos mais manjados de discussão, fala tudo com uma segurança tão grande que nos faz esquecer por um segundo que já vimos esse filme tantas e tantas vezes. Mas a sensação final é mesmo de que os diretores parecem nadar fora do mar que conhecem, e, mesmo que nunca seja muito produtivo dizer o que um filme deveria ser, é quase impossível não pensar o que os dois fariam com essa mesma história em um documentário, vide que quase todos os personagens, com exceção de John Bartlett (interpretado por Ifans), estão vivos e em evidência até hoje.