Português (Brasil)

|Crítica| 'Meu Vizinho Adolf' (2023) - Dir. Leon Prudovsky

|Crítica| 'Meu Vizinho Adolf' (2023) - Dir. Leon Prudovsky

Crítica por Raissa Ferreira.

Compartilhe este conteúdo:

'Meu Vizinho Adolf' / A2 Filmes

 

Título Original: My Neighbor Adolf (Israel)
Ano: 2023
Diretor: Leon Prudovsky
Elenco : David Hayman, Udo Kier, Olivia Silhavy e Kineret Peled.
Duração: 96 min.
Nota: 2,5/5,0

 

O filme cheio de estereótipos de Leon Prudovsky até tem seus momentos mais afetuosos, mas perde várias chances de se aprofundar na comédia ou no drama em mais uma tentativa de olhar com leveza para os fantasmas do holocausto

As cores e a ambientação calorosa que preenchem a tela no início de “Meu Vizinho Adolf” logo se perdem para uma lavagem sem vida, que marca a transição de um tempo de mudanças no mundo todo. O salto temporal dos anos 30 para os anos 60 é também a mudança de ambientação para um lugar remoto, numa zona praticamente rural da América do Sul, em que o filme se concentra na pequena e triste vida do sobrevivente Polsky e sua roseira, uma lembrança de uma vida, e de uma família, que se foi. Existem diversas tentativas no cinema de abordar os traumas do nazismo com alguma leveza, olhando com humor para os acontecimentos ou para a figura de Hitler, no entanto, os esforços de Prudovsky em dar uma nova roupagem para esses fantasmas, individualizando a história, se apegam a outras referências cinematográficas que resultam em algo com breves lapsos de empatia e conexão com a obra, mas muitos momentos esquecíveis. A ideia de criar algo nos moldes de “Janela Indiscreta” (Alfred Hitchcock, 1954) é até divertida, mas, por ser totalmente pautada na paranoia que ironiza a todo momento a senilidade dos personagens, acaba banalizando sua própria narrativa por grande parte da duração.

Uma problemática mais latente do filme está na caracterização dessa América do Sul e seus moradores bem estereotipada, que fica um tanto lamentável na cena do “tribunal” que busca conciliar os vizinhos. Mas, até mesmo nas buscas de Polsky para conhecer melhor seu inimigo, o vizinho-possível-Hitler (Udo Kier), o filme todo parece pautado por clichês que reforçam uma banalização das teorias do velho judeu, o que acaba minando qualquer força dramática que o longa poderia ter, enfraquecendo seu personagem. Todo apego pelas roseiras, por exemplo, carrega uma beleza pouco explorada, que fica num canto do longa, nunca esquecida, mas apenas pincelada superficialmente. É na relação de empatia entre os dois homens que os esforços vão se focar para trazer alguma conexão entre o espectador e a obra, que até tem alguns efeitos positivos, mas ainda fica um tanto perdido no caminho.

Com a comédia existe um movimento similar que se alia à trilha sonora para tentar se fortalecer. Em um filme onde muitos idiomas se misturam, parece que seus elementos também não se comunicam da melhor forma. Ocorre em algumas cenas, com forte apelo dramático, uma trilha que puxa o tom cômico, o que além de soar desconexo, acaba diminuindo os acontecimentos. Muitas vezes parece uma tentativa de amenizar situações bastante dolorosas, já que o diretor está falando de um trauma muito denso e difícil por um prisma leve, mas o resultado é uma sucessão de climas sendo cortados e oportunidades sendo perdidas. São nos momentos de maior entrosamento e entrega entre os dois personagens, judeu e possível Hitler, que o filme ganha alguma alma, trabalhando na ambiguidade dos possíveis maiores inimigos históricos sentindo empatia um pelo outro. É algo um tanto piegas, mas são as cenas mais interessantes e que melhor exploram o potencial de seus atores.

Apesar de andar numa linha bem fina quando aproxima os dois homens, o diretor acaba deixando claro seu ponto. Se grande parte da obra praticamente ridiculariza a investigação e a paranoia de Polsky, em determinado momento, quando suas ideias começam a se encaixar e fazer sentido, é como se brevemente o filme flertasse com uma redenção para um dos maiores vilões históricos, o que seria bastante problemático, mas a partir do momento que o velho judeu e Herzog criam uma relação mais forte, fica bem claro que para ser uma pessoa digna de empatia e afeto o homem jamais poderia ser realmente Hitler e qualquer sinal de confirmação das teorias de Polsky, minam completamente o carinho sentido. 

Ainda assim, Prudovsky abraça um desfecho fundamentado num sentimentalismo bem fraco, onde todos são vítimas da mesma tragédia e nesse mundo um sobrevivente do holocausto e um sósia de Hitler podem ser grandes amigos, partilhando uma busca por fazer as pazes com o passado e seguir em frente. A roseira que poderia ser tantas coisas permanece apenas como um símbolo, assim como “Meu Vizinho Adolf”, que até traz alguns bons sentimentos, mas não tem potencial para ser marcante. 

Compartilhe este conteúdo: