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|Crítica| 'M3GAN' (2023) - Dir. Gerard Johnstone

|Crítica| 'M3GAN' (2023) - Dir. Gerard Johnstone

Crítica por Victor Russo.

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'M3GAN' / Universal Pictures

 

Título Original: M3GAN (EUA)
Ano: 2023
Diretor: Gerard Johnstone
Elenco : Allison Williams, Violet McGraw, Jenna Davis, Amie Donald e Jen Van Epps.
Duração: 102 min.
Nota: 3,0/5,0
 

“M3GAN” se usa da frontalidade típica da Blumhouse para falar sobre o medo da tecnologia sob uma ótica bem ambígua, em um filme engolido por telas e aparelhos

Um dos filmes mais aguardados do ano, “Megan” combina terror e ficção científica a partir da premissa mais recorrente do segundo gênero. Histórias sobre inteligências artificiais que se rebelam e dominam a sociedade ou seus criadores se multiplicaram nos cinemas desde a chegada de “2001 - Uma Odisseia no Espaço”, em 1968. Ao mesmo tempo, desde “O Brinquedo Assassino”, de 1988, são recorrentes as obras de terror com bonecos possuídos. O novo longa, vendido sob o nome de James Wan, mas que na verdade é dirigido por Gerard Johnston, tenta se diferenciar justamente por unir esses dois mundos. 

Assim, “Megan” se usa das possibilidades temáticas e estruturais de ambos os gêneros, assim como os combinam com elementos de melodrama, sobretudo na relação entre tia e sobrinha, e cinema de ação. Em certo sentido, Johnston tem em Wan o protótipo do filme que ele quer alcançar, em como este consegue lidar com uma narrativa que une gêneros e subgêneros completamente diferentes com uma naturalidade assustadora.

Ainda que não demonstre a mesma habilidade para trafegar entre os gêneros como o seu “mentor” e precise travar o andamento do filme constantemente em blocos de sequências que nem sempre parecem conversar, Johnston não tem medo algum de aproveitar tanto o melodrama quanto o terror para dar a abordagem mais frontal possível. O jump scare, do qual Wan faz uso constantemente, aqui não só entra como recurso para assustar o público, mas também para fazer o mesmo com outros personagens dentro da diegese, usando do vale da estranheza como a base desse terror mais creep, em que o nosso cérebro demora para processar aquela ameaça que não é nem boneca nem robô, mas é os dois ao mesmo tempo. 

Smelhante aos sustos, o cineasta também faz uso do melodrama mais escancarado e exagerado, apenas com o intuito de criar uma base dramática entre tia e sobrinha, para depois deixar claro que esse é o menor dos interesses do filme. De certa forma, essa recusa à austeridade dramática comum nos chamados (infamemente) “pós-terror” ou “terror elevado” tudo tem a ver com a proposta da Blumhouse como produtora, essa busca pelo terror direto e capaz de atingir todo o público. Obras geralmente baratas e lucrativas, que variam em qualidade a partir do diretor responsável por cada uma. Entretanto, se tal abordagem tem o tom adequado para “Megan”, a grande introdução, antes que a IA que dá nome ao filme apareça, não deixa de ser o momento mais fraco do longa, surgindo quase como um protocolo, forçando-nos a se importar com a relação daquelas duas personagens, mesmo sabendo que elas são meros gadgets da narrativa da Megan, a verdadeira protagonista.

Porém, esse ato inicial acaba por ser eficiente em mostrar aquilo que é a alma do longa: um mundo dominado pela tecnologia. Ou seja, se a relação entre tia e sobrinha soa como mero protocolo dramático, ao construir tal relação o filme já insere telas, brinquedos e as mais variadas formas de tecnologia, pela qual essas personagens dependem para viver. Essa mise en scène quase controlada pela inovação e tecnologia é o que sustenta a temática do filme e o torna diferente da histórinha de uma IA rebelde e assassina com a moral “tecnologia é ruim”.

Claro que “Megan” explora de forma bem óbvia os malefícios do uso indiscriminado e obsessivo da tecnologia. Mas é mais do que essa mensagem básica. O longa está mais interessado em apresentar a tecnologia de maneira mais ampla, como algo que faz parte da nossa vida, não necessariamente para o bem ou para o mal, mas simplesmente como algo que está no mundo e usamos como queremos. Com isso, essa tecnologia pode ajudar na locomoção ou na briga final, assim como pode ser vilã também quando levada ao limite. Porém, nunca há o discurso conservador de que sem a tecnologia nós vivemos melhor. O longa nunca dá às personagens “armas” não tecnológicas para combater a M3gan. Pelo contrário, a única personagem que recusa a tecnologia é eliminada sem apresentar qualquer resistência. 

Há espaço ainda para o velho debate entre racionalidade e emoção vir à tona, sem muito aprofundamento, é verdade. E, por mais que possa parecer contraditório, mesmo nesse filme extremamente tecnológico, “Megan” é capaz de inserir a fantasia típica do cinema no desenvolvimento narrativo. Se a boneca não é amaldiçoada e sim cientificamente evoluída, ainda assim, Johnston encontra espaço para o controle absoluto da eletricidade, como as tradicionais luzes piscando, sem sentir (ainda bem) a necessidade de explicar como ela consegue dominar tudo. Ela simplesmente o faz, vai de nós comprarmos essa realidade ou não.

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