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|Crítica| 'Indiana Jones e a Relíquia do Destino' (2023) - Dir. James Mangold

|Crítica| 'Indiana Jones e a Relíquia do Destino' (2023) - Dir. James Mangold

Crítica por Victor Russo.

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'Indiana Jones e a Relíquia do Destino' / Lucasfilm

 

Título Original: Indiana Jones and the Dial of Destiny (EUA)
Ano: 2023
Diretor: James Mangold
Elenco : Harrison Ford, Phoebe Waller-Bridge, Mads Mikkelsen, Antonio Banderas, John Rhys-Davies e Toby Jones.
Duração: 154 min.
Nota: 2,5/5,0

 

Sem renovar ou fechar a franquia, “Indiana Jones e a Relíquia do Destino” olha para trás, mas perde a magia dos predecessores ao carregar as principais tendências do blockbuster atual

Após “Blade Runner 2049” e “Star Wars: O Despertar da Força” e aos 80 anos de idade, Harrison Ford retorna a mais um personagem popular a fim de dar uma nova direção para a franquia. Entretanto, se o segundo Blade Runner muda o protagonismo e permite um futuro sem Rick Deckard e o sétimo Star Wars não teve problema algum em matar o coadjuvante Han Solo, o quinto Indiana Jones reforça a dependência da franquia para com o personagem-título. Apesar da apresentação de Helena Shaw, vivida pela carismática e debochada Phoebe Waller-Bridge, que cai como uma luva na franquia, o primeiro longa da série de filmes não dirigido por Steven Spielberg se aceita no lugar de ser só mais um Indiana Jones. Parece que a visão sempre comercial da Disney é a de deixar tudo em aberto e seguir a franquia dessa forma caso o filme renda lucro nas bilheterias (o que não deve acontecer).

Olhando pela perspectiva de uma franquia de aventura, cheia de sequências de perseguições, lutas e tiroteios, ter um protagonista com mais de 80 anos é um limitante gigantesco, fazendo o longa recorrer a um dublê de corpo com Ford rejuvenescido digitalmente (a primeira das muitas tendências do blockbuster contemporâneo aqui presentes) na principal sequência da obra. Entretanto, deixando de lado o futuro da franquia e olhando para “Indiana Jones e o Chamado do Destino” em si, é bem perceptível o porquê da escolha de James Mangold para a direção do primeiro Indiana Jones sem Spielberg na função. Apesar de alguns bons trabalhos no currículo, como “Os Indomáveis” e “Logan”, o cineasta é daqueles que sabem lidar com filmes de estúdios, sendo competente dentro dessa lógica que apaga a autoria do diretor.

Dessa forma, Mangold é capaz de trazer a energia característica da franquia, com as costumeiras perseguições que criam diversas piadas visuais pelas situações meio bizarras que são construídas (uma herança da comédia física de Charles Chaplin, Buster Keaton, Harold Lloyd e afins). E, nesse sentido, ele capta bem a essência de Indiana Jones, um filme que se move pelas grandes sequências e os enigmas a serem resolvidos. A estrutura é a mesma, inclusive a resolução desses enigmas partirem sempre de Indiana e seus companheiros, nesse caso, Helena, enquanto os vilões nazistas só os seguem sem a capacidade de desvendar nada por conta própria. Nesse sentido, apesar de não propor nada de novo, o filme se coloca no lugar de ser mais um Indiana Jones, lugar que o anterior, “O Reino da Caveira de Cristal”, não aceitou e foi rejeitado em boa parte por arriscar com uma fantasia mais escancarada que não caiu bem com os fãs mais puristas (além de outras questões realmente mais problemáticas que não vêm ao caso se aprofundar agora).

Porém, se por um lado Mangold consegue criar um Indiana Jones funcional, por outro, o grande problema é justamente esse: aceitar-se como apenas um filme qualquer de um franquia de mais de quatro décadas. A personalidade do cineasta presente nos dois faroeste já citados não retorna aqui. “Indiana Jones e o Chamado do Destino” é o diretor no modo automático que agrada ao estúdio, e, consequentemente, transforma a obra em mais um filme de algoritmo. Se eu disse anteriormente que o longa não propõe nada de novo é justamente por como ele volta o seu olhar apenas para o passado. Prefere a replicação à revisão. É a prática meramente nostálgica para com os anos 80 que se multiplica no blockbuster hollywoodiano dos últimos anos, com algumas raras exceções mais particulares, como o recente “Top Gun: Maverick”, que se diferencia do original tanto em como revisa temas, quanto principalmente em como lida com a ação.

Assim, o novo Indiana Jones até toca em uma ou outra questão mais atual envolvendo Helena, porém, até nesse sentido, soa mais como obrigação do que de forma genuína. No geral, a personagem é posta na posição de uma sidekick que participa mais, mas diminuída pela necessidade que o longa se coloca de reverenciar e referenciar o passado. É o close no chapéu (marca registrada do personagem) a cada cinco minutos ou aparições de personagens e citações de eventos dos filmes anteriores sem qualquer peso que dominam o longa. A idolatria à nostalgia pura e simples. Isso se torna ainda mais problemático quando o filme volta a olhar para países pelo mundo, sobretudo do Oriente Médio, com a tradicional visão americanizada e preconceituosa.

Todavia, se a franquia parece nunca disposta a se reinventar, é natural que esse comodismo industrial colocasse o longa também dentro da lógica de um cinema blockbuster atual extremamente amarrada e replicada, algo em parte semelhante ao que foram os anos 80 (talvez por isso tantas dessas franquias voltam aos cinemas hoje), mas sem a mesma ingenuidade fantasiosa, o que torna “Indiana Jones e o Chamado do Destino” ainda mais sem vida. Por ser uma franquia de aventura, Indiana Jones sempre fez um bom uso da fantasia para a construção desse mundo, seja na premissa das relíquias, nas ações executadas pelo protagonista no caminho ou, principalmente, na revelação por trás desses objetos mágicos. 

Ainda que em 2008 essa obsessão pela lógica e pelo realismo já estivessem minando a imaginação do cinema americano, Spielberg manteve o quarto longa dentro desse lugar mais fantasioso. O quinto soa tão protocolar que até isso ele rejeita em prol da experiência mais confortável para o seu espectador-fã. Claro que o CGI domina a tela (não só no rejuvenescimento de Ford) e, mais uma vez, a necessidade de realismo torna o filme extremamente escuro ou entrecortado em suas sequências de ação (uma tentativa de esconder as imperfeições da computação gráfica). Só que a zona de conforto não para por aí e vai ter o seu ápice na revelação da relíquia. A fantasia dá lugar a conceitos de ficção científica explorados ao máximo recentemente, para o público se sentir em casa. Ainda é ficção, mas revestida de realidade, sem vida como quase todo o longa.

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