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|Crítica| 'Doutor Estranho no Multiverso da Loucura' (2022) - Dir. Sam Raimi

|Crítica| 'Doutor Estranho no Multiverso da Loucura' (2022) - Dir. Sam Raimi

Crítica por Victor Russo.

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'Doutor Estranho no Multiverso da Loucura' / Disney Brasil

 
Título Original: Doctor Strange in the Multiverse of Madness (EUA)
Ano: 2022
Diretor: Sam Raimi
Elenco : Benedict Cumberbatch, Elizabeth Olsen, Chiwetel Ejiofor, Benedict Wong, Xochitl Gomez e Rachel McAdams.
Duração: 126 min.
Nota: 3,0/5,0

 

Frustrando expectativas, o grande mérito de “Doutor Estranho no Multiverso da Loucura” está em ser muito mais simples do que o público espera

Depois de quase 15 anos de Universo Marvel e uma fórmula não só estabelecida, como também repetida à exaustão, seria ingenuidade esperar um filme autoral ou fora dessa onda que a Marvel tem surfado sem se arriscar. Então, resta ao público mais observador se contentar apenas com alguns vislumbres do que Sam Raimi é capaz de fazer atrás das câmeras.

Falar que “Doutor Estranho 2” é um filme ousado ou de terror, como muitos críticos e portais tentaram espetacularizar após a cabine de imprensa, é um tremendo exagero. Mas isso não quer dizer que o longa não tenha assim algumas ideias e escolhas visuais que vêm do cinema de horror, sobretudo do terror trash, em que Sam Raimi começou e construiu grande parte de sua carreira.

Mas, voltemos um pouco ao ponto central do longa: a sua narrativa direta. Como um universo que não só existe há mais de uma década, como também tem pretensão de existir por mais outra década, é normal a Marvel apostar em um marketing agressivo a cada filme, tentando transformar cada um deles em grandes eventos e enchendo os trailers e demais materiais de divulgação de possibilidades para fãs e páginas geeks teorizarem.

Óbvio que em “Doutor Estranho 2” não foi diferente. Desde a confirmação da Feiticeira Escarlate no primeiro trailer, até aparições que sugeriam relações diretas com as séries, uma grande expectativa foi criada nos fãs. Expectativa essa não só para um simples filme, mas para um “evento cinematográfico que todo mundo deveria ver nos cinemas”, algo semelhante a como venderam o último “Homem-Aranha” e estão divulgando o próximo “Thor”.

Entretanto, apesar do marketing agressivo, “Doutor Estranho 2” é um filme muito mais simples narrativamente e despretensioso do que todos esperavam, o que pode até gerar uma certa frustração em boa parte do público. A expectativa por uma viagem no multiverso cheia de conceitos é substituída por uma perseguição pelo multiverso, que, no fim das contas, fica quase inteira restrita a três personagens centrais, duas realidades e algumas aparições para fã gritar no cinema.

Só que, essa abordagem mais direta que pode frustrar muita gente que já construiu um filme em sua cabeça antes mesmo de ir ao cinema, no final das contas acaba por ser o maior mérito desse longa. É a partir dela que a obra debate e se aprofunda no personagem central que dá nome ao filme. Mais do que isso, por não precisar explicar tanta coisa (ainda que tenha muita exposição desnecessária), Raimi é capaz de ter o mínimo de liberdade para focar mais em sensações do que em acontecimentos.

É, sem dúvidas, um dos filmes da Marvel com uma construção menos óbvia e mais preocupado em fazer o público viver aquela urgência angustiante dos personagens. Claro que nada disso é levado ao limite e todas as escolhas de Raimi são constantemente rompidas para a inserção de alguma piada ou explicação à la Marvel, mas, ainda assim, o diretor consegue, em grande parte, construir momentos genuinamente dramáticos, tensos ou desorientadores.

O terror parte da escolha de um vilão indestrutível que obriga os heróis a fugirem se quiserem sobreviver. Essa lógica muito comum no slasher permite a Raimi explorar espaços escuros, aparições inesperadas, brincar com o tempo, tanto de expectativa quanto de urgência para fuga, e ainda trabalhar com uma maquiagem que bebe muito na fonte do cinema trash. Ao mesmo tempo, ele se sente livre para criar sequências puramente visuais, desde sobreposições e distorções da imagem, até uma série de recursos visuais pouco explorados na Marvel, como uma perspectiva diferente em uma casa mal assombrada ou uma viagem dimensional levada ao limite do absurdo.

Assim, fica claro que sempre que Raimi tem alguma liberdade, ele é capaz de pensar um pouco fora da caixa. Ou melhor, da fórmula. Por isso, se o filme não engrena totalmente, isso ocorre justamente pela necessidade dessa obra se ligar com o universo como um todo e na obrigação de agradar fãs com fan services toscos, como a frase “Eu poderia fazer isso o dia todo” ou aparições irrelevantes. Mas pior que isso só o que fazem com a série “Wandavision”, que perde quase sua total relevância (em termos de história, e, não, artística) depois desse filme. No fim do dia, talvez “Doutor Estranho 2” seja o máximo de liberdade que um cineasta terá na Marvel, o que não é tanto assim, mas é muito melhor do que um Jon Watts da vida.

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