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|Crítica| 'Capitão América: Admirável Mundo Novo' (2025) - Dir. Julius Onah

|Crítica| 'Capitão América: Admirável Mundo Novo' (2025) - Dir. Julius Onah

Crítica por Victor Russo.

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'Capitão América: Admirável Mundo Novo' / Walt Disney Studios

 

Título Original: Captain America: Brave New World (EUA)
Ano: 2025
Diretor: Julius Onah
Elenco: Anthony Mackie, Harrison Ford, Danny Ramirez, Shira Haas, Tim Blake Nelson, Giancarlo Esposito e Carl Lumbly.
Duração: 119 min.
Nota: 2,5/5,0
 

A premissa interessante, os símbolos poderosos e até a tentativa de replicar 'Soldado Invernal' se esvaem em revelações precipitadas e a ação protocolar sem qualquer trabalho de imagem

O modus operandi do Universo Marvel já é conhecido há muito tempo, mas certamente há um ponto de ruptura pós-Vingadores: Ultimato. Não que a lógica seguida a partir de então fosse diferente da anterior ao longa de 2019, entretanto, até então havia uma coesão no universo (ainda que boa parte dos filmes fossem tão fracos quanto os mais recentes) e um foco definido, apenas com obras cinematográficas e com um grande inimigo sendo anunciado como o chefão final do game a ser vencido para zerar o jogo. A continuação puramente comercial após derrotar Thanos, que veio junto a alguns medalhões do universo deixando seus papéis icônicos, ao mesmo tempo que a gula por mais dinheiro da Disney não pisou no freio, mas triplicou a aposta, criando mais filmes e diversas séries por ano, achando que todo o público apaixonado pelo MCU seguiria assistindo qualquer coisa que os fossem entregue. Desculpas foram dadas para agregar mais gente, inclusive as novas aquisições que antes pertenciam à FOX, e o multiverso rapidamente se provou uma bagunça, mais uma muleta para justificar qualquer coisa do que uma solução para a Marvel seguir dominando as telonas e telinhas. 

Correndo paralelamente a isso, com obras querendo se conectar, mas que não podiam ser mais desinteressantes entre si, Kevin Feige seguiu tentando seduzir talentos mais conhecidos, como Sam Raimi, e, principalmente, jovens que se destacaram no cinema independente, como é o caso de Julius Onah, que dirige Capitão América: Admirável Mundo Novo, a fim de tentar dar uma grife para esse universo com interesse sendo perdido gradativamente. Só que, se a lógica narrativa, a chamada “fórmula Marvel”, já existia desde os primeiros filmes, com o passar dos anos a produção industrial do estúdio não só estabeleceu regras a serem seguidas, como a grande batalha ao final, as piadas que rompem com o drama o tempo todo, os cameos e piscadinhas para fãs, as cenas pós-créditos, a não finalização daquela história, sempre com os longas terminando deixando um gancho para o filme ou série seguinte etc, passaram a ultrapassar a trama, a história contínua e elementos pontuais da narrativa, e se transformaram em uma concepção estética (chamar de “concepção” é ser bonzinho demais), dominada por um controle na mão dos artistas de efeitos visuais (na verdade, dos executivos), tanto antes da contratação do cineasta, quanto após as filmagens. Assim, não importa quem dirige o novo longa ou série do MCU, o visual será a mesma massaroca digital acinzentada, sem profundidade, sem cor, e, principalmente, sem qualquer pensamento de decupagem (a seleção dos planos, o que deveria partir do diretor), sobretudo nas sequências de ação.

Então, Onah até tenta mirar no que já deu muito certo, o thriller político de investigação e conspiração que foi a base do sucesso de Capitão América Soldado Invernal, além de reconhecer o potencial de alguns símbolos, como um homem negro vestido com macacão de presidiário se desesperando ao ser encarcerado injustamente mais uma vez, ou mesmo a imponência de Sam Wilson, com uma postura sempre firme e dominante de Anthony Mackie, sendo agora um homem negro sem super soro o símbolo dos Estados Unidos. Inclusive, o heroísmo que circula o personagem é interessante o suficiente, diferente de outros personagens do estúdio que querem ser super-heróis porque é descolado, Sam sente o peso do dever. Una isso a um foco em “Thunderbolt” Ross (agora vivido por Harrison Ford), um ex-militar e vilão, virando Presidente dos EUA (em ano de Donald Trump assumindo o cargo de novo) e um vilão secreto que trabalha com possibilidades e manipulação sem um grande poder. 

A base de Capitão América: Admirável Mundo Novo parece um prato cheio para uma abordagem mais setentista/oitentista, com cara de Guerra Fria e segredos de estado sendo investigados, o que até acontece durante quase metade do longa, momento esse em que a ação é muito mais contida, em espaços fechados, contando quase sempre com alguma encenação definida (com exceção da bagunça que é a sequência do atentado na Casa Branca, uma série de planos aleatórios sem qualquer continuidade espaço-temporal). É como se quando Onah tivesse algum controle, o longa gerasse certo interesse e vontade mesmo de se diferenciar das obras mais recentes do estúdio. Isso não dura muito.

A proposta da direção (e do roteiro) é tão desvinculada dos interesses do estúdio que tudo se constrói com um mistério sobre como Ross está sendo manipulado pelo vilão e os ataques de raiva que parece ter. Todavia o mistério se transforma em uma bobagem quando grande parte do material de divulgação é focado em Ross virando o Hulk Vermelho. Ou seja, o longa propõe algo, mas o marketing, feito por outras pessoas, desmantela essa proposta. O mesmo está presente nesse foco investigativo do thriller político com pitadas de ação, que só vai até a segunda página, até o momento em que o estúdio assume o controle e transforma tudo em um filme de ação genérico da Marvel, com conflitos globais transmitidos pela televisão, recheado de caças, explosões, super-heróis voando e destruindo cidades, rompendo com tudo que o longa estabelece como base narrativa, e, principalmente, como mise en scéne. A ação mais “humana” e coreografada vira o típico borrão sem profundidade, luz e cor, desinteressante do início ao fim. Sam e tudo que o cerca passa a importar menos do que a necessidade de seguir estimulando uma base de fãs acostumada a se empolgar com explosões e tiroteios que a gente mal enxerga ou entende. 

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