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|Crítica| 'Bob Marley: One Love' (2024) - Dir. Reinaldo Marcus Green

|Crítica| 'Bob Marley: One Love' (2024) - Dir. Reinaldo Marcus Green

Crítica por Victor Russo.

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'Bob Marley: One Love' / Paramount Pictures

 

Título Original: Bob Marley: One Love (EUA)
Ano: 2024
Diretor: Reinaldo Marcus Green
Elenco : Kingsley Ben-Adir, Lashana Lynch, Jesse Cilio, Tosin Cole, Michael Gandolfini e Nadine Marshall.
Duração: 104 min.
Nota: 2,5/5,0
 

Em um filme que exalta seu protagonista como revolucionário, Reinaldo Marcus Green não vai muito além da cinebiografia de homenagem quadradona, ainda que com um recorte mais interessante

Responsável pelo péssimo “King Richard”, que rendeu incontáveis prêmios a Will Smith, Marcus Green parece ser um daqueles nomes de interesse dos estúdios para filmes específicos. Ainda que não tenha começado a carreira dessa forma, o cineasta parece cada vez mais confortável nessa posição de fazer cinebiografias de homenagem, com familiares do biografado na produção, a fim de exaltar a figura retratada com a fórmula que se repete a cada novo longa do gênero. Não há muito espaço para criação, soa tudo como algo encomendado por um estúdio e cabe ao cineasta apenas filmar aquilo da forma como o público já está acostumado, pois o que importa mesmo para os produtores é apenas contar a história resumida e com foco em eventos mais importantes ou conhecidos daquela figura que é o verdadeiro atrativo. Assim, a importância sai do criar e se envolver de forma mais preocupada com a linguagem cinematográfica e se volta quase que completamente para o que é contado, tornando a imagem e o som meros acessórios ilustrativos para isso. O fato de que o público foi tão condicionado a assistir o mesmo filme favorece os estúdios a manter essa prática que eles mesmos criaram. É mais um exemplo da indústria construindo a demanda e lucrando com ela à custo dos espectadores e do próprio cinema.

Dito isso, “Bob Marley: One Love” está longe de ser uma das piores nessa enxurrada de obras cinebiográficas que vemos todos os anos. O lançamento no começo do ano e não em datas mais atrativas para temporadas de premiação é até curioso, já que esses filmes geralmente têm como respaldo comercial as indicações, sobretudo em categorias de atuação, em grandes premiações, como o Oscar, que amam abraçar esse tipo de longa. Soa como um descarte do estúdio, que não via nesse filme esse potencial para investimento. Só que, se colocarmos em perspectiva com as demais obras semelhantes, como o próprio “King Richard” ou de nomes da música, como “Bohemian Rhapsody”, “One Love” tem um recorte e uma atuação central, geralmente os dois pilares na replicação das cinebiografias, muito mais interessantes.

Claro, as cartas continuam marcadas, há o momento em que o casal vai brigar e gritar, a cena em que o protagonista vai confrontar o empresário que passa a perna nele, os flashbacks da infância (aqui ainda com aquela fotografia amarelada que era uma marca dos flashbacks há umas décadas e que hoje soa um tanto ultrapassada, a partir do momento em que o público já tem pleno entendimento dessa estrutura narrativa sem precisar de uma explicação visual mais evidente), os textos ao começo e ao final, com um acréscimo no encerramento de imagens e vídeos do Bob Marley real e por aí vai. “One Love” realmente pouco faz de diferente dessa cartilha cinebiográfica. Entretanto, o recorte principal de apenas dois anos na vida do Bob Marley funciona como um dispensar de apresentações para esse ícone da música (os flashbacks se tornam ainda mais problemáticos por isso). É como se ele fosse tão gigantesco que não precisasse mais construir sua vida, bastava aquele contexto histórico e político específico para nos conectarmos com aquela espécie de mito intocável e sublime, de uma pureza jamais vista.

Tal escolha favorece o ótimo Kinglsey Ben-Adir. Passado o estramento inicial do sotaque, que vai deixando de soar forçado a partir do momento que o personagem se solidifica, Ben-Adir tem na não tentativa de reprodução fiel à realidade de Marcus Green, algo muito comum no gênero e que fez de Smith em “King Richard” uma caricatura meio bizarra de trejeitos artificiais, uma possibilidade do ator construir e não apenas mimetizar. O seu Bob Marley pode até passar pelos mesmos eventos, shows, fazer algumas danças e ter uma voz semelhante à pessoa real. Mas até essa parte musical é reduzida no longa, os shows são curtíssimos, espaçados nessa montagem típica de elipses, ainda que os saltos sejam temporalmente curtos aqui. Assim, o filme se volta para uma questão mais íntima, da religião e de como o personagem se enxerga no mundo. Ben-Adir capta essa proximidade com seu próprio dopersonagem, de fala calma, olhar otimista e humanidade implacável. Em meio a tanta replicação de fórmula, é o ator e a proposta que lhe é dada que fazem de “One Love” um pouco mais interessante que a média das cinebiografias.

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