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|Crítica| 'Amsterdam' (2022) - Dir. David O. Russell

|Crítica| 'Amsterdam' (2022) - Dir. David O. Russell

Crítica por Victor Russo.

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'Amsterdam' / 20th Century Studios

 

Título Original: Amsterdam (EUA)
Ano: 2022
Diretor: David O. Russell
Elenco : Christian Bale, Margot Robbie, John David Washington, Robert De Niro, Anya Taylor-Joy, Rami Malek, Chris Rock e Zoe Saldaña.
Duração: 134 min.
Nota: 3,0/5,0
 

David O. Russell se diverte ao trabalhar os códigos do noir sob a lógica da comédia de erros, mas joga quase tudo fora nos 20 minutos finais

Russell é um diretor curioso, com filmes que quase sempre aparecem em categorias principais do Oscar, ao mesmo tempo que é mal visto pela sua forma de trabalhar com os atores e por transformar a sua autoria em sátiras enfeitadas que se acham espertinhas, o que o faz ser rejeitado por grande parte da crítica. A verdade é que os bons filmes do diretor inexistem há tempos, talvez desde “O Vencedor”, apesar do sucesso em premiações de “Trapaça” e “O Lado Bom da Vida”. 

Isso unido ao elenco estelar faz de “Amsterdam” um projeto que já nasce com uma pulga atrás da orelha. Não são poucos os críticos que foram assisti-lo prontos para criticá-lo e assim o fizeram, ainda que haja muitos méritos aqui, muito mais do que em seus três trabalhos anteriores.

A grande sacada de sua nova obra e nada comentada até então está em como o filme que vem sendo criticado por ser “confuso” ou “desperdiçar o elenco” na verdade usa esses dois elementos como um mote narrativo que se debruça na estrutura e nas características típicas de um filme noir. Ou neo noir, no caso.

Não comparando a qualidade fílmica, mas ninguém critica “À Beira do Abismo” por ser confuso ou em grande parte incompreensível. Muito pelo contrário, está justamente aí a graça do delicioso filme de Howard Hawks. O mesmo vale para “Amsterdam”, que está longe de ser tão confuso quanto o longa da década de 1940, e que usa esse aspecto típico da narrativa noir como uma forma de diversão.

Assim, a busca do filme não está em resolver rapidamente o mistério ou em deixá-lo claro para o público. Muito pelo contrário, como um típico neo noir, que se utiliza dos códigos do gênero, mas o faz de maneira distanciada ou a fim de subvertê-los de alguma forma, “Amsterdam” tem total consciência do quão absurdo é o mistério proposto, e justamente por isso o joga em uma espiral de perguntas que só abrem mais perguntas e levam a mais personagens que supostamente as resolveria, mas que na verdade só servem para gerar mais informações contraditórias ou vagas, abrindo ainda mais a narrativa ao invés de fechá-la.

E é justamente pela graça do filme estar justamente em como o filme lida com o noir, tanto na conspiração como premissa, na confusão gerada pela busca por respostas, quanto em elementos de ambientação e estéticos, como se passar no pós-guerra (o gênero surge como uma resposta para à Segunda Guerra, enquanto Russell faz do pós-Primeira Guerra tema para falar da ascensão do nazismo às escondidas), os planos tortos e oníricos, a hiperestilização, a narração, a paranoia em off etc, que o filme se trai por completo quando nos 20 minutos finais abre mão dessa obsessão pelo mistério para entregar uma resolução óbvia e de mão beijada para o espectador, com direito a um videozinho à la telecurso 2000.

Já em relação ao elenco estelar ser mal explorado está muito mais ligado a uma expectativa do longa do que à proposta do filme em si. Isso porque, não só todos, com exceção feita à Taylor Swift, têm um bom tempo de tela e se adequam perfeitamente a essa proposta mais estilizada e satírica de atuação proposta por Russell, como também servem a uma narrativa que usa os seus rostos justamente como piada para a solução do mistério. A cada grande nome que aparece, nós já criamos a expectativa de que aquele personagem, pela magnitude do ator, será o responsável por resolver o caso. E mais uma vez a graça parte disso, quando o cineasta o utiliza apenas como peças desse jogo de idas e vindas, perguntas e informações desencontradas.

Assim, “Amsterdam” está longe de ser a desgraça que muita gente vem dizendo por aí e encontra até um David O. Russell menos pretensioso, mais descompromissado e inconsequente, disposto a se divertir com sua obra e divertir o público que vier mais aberto a receber sua proposta de mistura de gêneros clássicos.

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