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|Crítica| 'Adão Negro' (2022) - Dir. Jaume Collet-Serra

|Crítica| 'Adão Negro' (2022) - Dir. Jaume Collet-Serra

Crítica por Victor Russo.

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'Adão Negro' / Warner Bros. Brasil

 

Título Original: Black Adam (EUA)
Ano: 2022
Diretor: Jaume Collet-Serra
Elenco : Dwayne Johnson, Aldis Hodge, Pierce Brosnan, Noah Centineo, Quintessa Swindell, Viola Davis e Sarah Shahi.
Duração: 125 min.
Nota: 3,5/5,0
 

Jaume Collet-Serra combina a lógica do blockbuster do começo do século ao DCEU, em um filme que não vai mudar o gênero, mas tem mais personalidade que a maioria

Muito se modificou no cinema de super-heróis e no blockbuster como um todo após o lançamento de “Batman Begins” e, principalmente, “O Cavaleiro das Trevas”, ambos de Christopher Nolan. Para o bem ou para o mal, os estúdios adequaram a verossimilhança, ou podemos dizer até mesmo o realismo, a esses filmes de maior orçamento e populares que buscam levar grandes públicos ao cinema.

Então, se no começo dos anos 2000, ou até antes (“Superman - O Filme” é um bom exemplo aqui), os filmes de super-herói seguiam uma base até meio quadrinesca e brega, enchiam-se de frases de efeitos, cores e a lógica do mundo real pouco importava se comparado ao debate sobre o heroísmo e o fazer o certo, a partir de 2005, e mais fortemente de 2008, todo esse lado mais fantasioso, juvenil e exagerado foi dando lugar a filmes mais contidos, sombrios, sem muita cor, com uniformes que usavam os quadrinhos apenas como referência, mas seguiam uma estética mais real, enquanto o bem e o mal foi se tornando (ou tentando) mais complexo, com vilões com motivações palpáveis e heróis falhos. Apesar das piadinhas, logo de cara a Marvel aderiu essa lógica ao seu cinema e o perpetuou como uma fórmula repetida à exaustão.

Ainda que um pouco menos real e mais estilizada, por ter iniciado o universo sob o comando de Zack Snyder, a DC em pouco se diferenciou da Marvel no uso do sombrio (aqui até com mais seriedade) e complexo (ou a busca de), ainda que sem uma necessidade tão grande de tornar tudo super verossímil. Se na Marvel um Deus vir para a Terra requer uma explicação científica e esse Deus se transforma em um alien, na DC são só Deuses mitológicos mesmo.

Tal prática saturou o gênero de tal forma que os dois maiores estúdios de filmes de heróis não têm mais para onde correr, sobretudo a Marvel, que mantém a mesma fórmula por 15 anos (a DC tenta hora ou outra filmes como “The Batman” e “Coringa” ou pelo menos permite uma certa liberdade para diretores como Patty Jenkins e James Wan, ainda que dentro da estética proposta por Snyder para o universo). “Adão Negro” chega então em um momento pouco confortável para novos filmes do gênero, já que, se por um lado continuam gerando receita, por outro, o público está cada vez mais crítico a ver o mesmo filme repetidas vezes apenas com outro nome.

Entra em ação então o nome do subestimado Jaume Collet-Serra, que ao que tudo indicava seria apenas um diretor de estúdio a abaixar a cabeça para Dwayne Johnson e fazer um típico filme de The Rock, mas que na prática consegue imprimir sua personalidade tal qual Jenkins e Wan, mas com elementos estéticos bastante “novos” para esse universo e para o blockbuster atual como um todo.

Claro que “Adão Negro” ainda é um filme de herói em 2022 e não vai ousar tal como “The Batman”, principalmente por estar um pouco preso à “snyderização” do universo. Mas, ao mesmo tempo, Collet-Serra se utiliza bem dessa lógica de estúdio e da própria estética do Snyder para criar algo novo, autoconsciente e, sobretudo, resgatando muito da magia que os filmes de herói vêm perdendo ao longo dos últimos anos.

Então, sim, o longa ainda vai seguir a lógica do blockbuster atual, com personagens dúbios, um vilão que não é bem vilão se olharmos por uma lógica distanciada do ocidente. É quase um herói anti-imperialista, mas com um prazer por matar que não condiz com a posição de herói clássico e o filme vai debater justamente isso. O sombrio ainda se faz presente, assim como as grandes cenas de ação meio bagunçadas e cheias de CGI ou a expectativa de sempre criar pensando no filme seguinte.

Porém, Collet-Serra usa de alguns desses elementos, assim como da câmera lenta típica do Snyder, para criar uma estética que une o sombrio e realista a um brega idealista e fantasioso. Em meio a cenas cinzas ele insere cor por meio de uma personagem, a câmera lenta vira artifício para realce dramático de emoções e poderes, divertimento ou simplesmente para situar o público em meio a uma explosão de computação gráfica, num filme que pouco respira e constrói suas relações dramáticas no meio das inúmeras sequências de ação.

Una isso a elementos bastante melodramáticos, como mãe e filho ou amigos de longa datas que sabem do futuro, juvenis, como o garoto capaz de ser peça chave nessa luta por liberdade ao mesmo tempo que é fã de quadrinhos e molda o protagonista àquilo que já existe no próprio gênero, ou referências a outros gêneros e filmes, desde a aventura à la Indiana Jones até humanos lutando com múmias de fogo, totalmente inspirado no filme da década de 1990, e temos um filme que resgata esse fazer cinema mais despreocupado com o realismo e com foco em emoções mais intensas e até absurdas, perdido há mais de uma década.

Assim, “Adão Negro” continua sendo um filme que deve funcionar para o fãs do personagem e do DCEU, enquanto também ressalta um diretor pouco comentado que consegue criar dinâmicas bastante próprias ao lidar com o blockbuster. Ele já tinha feito isso com “Águas Rasas” e “Jungle Cruise”, e retorna com “Adão Negro”.

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