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|Crítica| 'A Estrela Cadente' (2024) - Dir. Fiona Gordon & Dominique Abel

|Crítica| 'A Estrela Cadente' (2024) - Dir. Fiona Gordon & Dominique Abel

Crítica Por Victor Russo.

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'A Estrela Cadente' / Pandora Filmes

 

Título Original: L'étoile Filante (Bélgica)
Ano: 2024
Diretores: Fiona Gordon e Dominique Abel
Elenco : Fiona Gordon, Dominique Abel, Kaori Ito, Philippe Martz e Bruno Romy.
Duração: 98 min.
Nota: 3,5/5,0

 

Kaurismaki encontra Tati em um filme que tudo é apenas desculpa para o humor dos corpos em movimentos

Em um primeiro instante, Estrela Cadente, novo filme da dupla Dominique Abel e Fiona Gordon, parece apenas uma tentativa de emular Aki Kaurismaki, ainda mais quando a primeira exibição da obra foi poucos meses depois de Folhas de Outono ser premiado no Festival de Cannes. Os personagens posicionados de frente para câmera, os cenários e a frieza dessas pessoas que pouco falam remete bastante a esse olhar do finalndês sobre a sociedade europeia (ainda que o longa de Abel e Gordon seja belga). Porém, rapidamente vai ficando evidente que esse distanciamento emocional e posicionamento em cena que remete bastante ao teatro pouco busca da pretensão mais social de Kaurismaki, assim como o humor não está necessariamente nas situações estranhas ou nos diálogos, mas no movimento desses corpos pelo espaço.

Assim, o visual típico de Kaurismaki vai encontrar um humor mais corporal e até bobo, remetendo um tanto a Jacques Tati, sobretudo no uso dos objetos de cena, e do cinema hollywoodiano dos anos 1920 (a comédia física de Charles Chaplin, Buster Keaton, Harold Lloyd e afins) e até dos anos 1930 (sendo a cena dos personagens se copiando como se fosse um espelho uma referência clara a O Diabo a Quatro). Só que, diferente de Tati, que comentava e ironizava a modernidade, ou Chaplin e Keaton que tinham muito de sua força no melodrama e na identificação com esses personagens, Abel e Gordon parecem preocupados apenas com a encenação e a metralhadora de piadas que são capazes de tirar a partir daí. Por mais que haja uma trama de crime, que até lembra um pouco o cinema noir, com direito a uma detetive particular (interpretada pela própria diretora), ou um romance rompido pela perda do filho, entre a mesma personagem e um dos dois interpretados pelo diretor, tudo isso pouca importância tem, é só uma forma da trama andar e, dessa maneira, gerar novas situações ridículas (mais um termo que não uso de forma pejorativa) e imprevisíveis.

Fica claro como a dupla se delicia mesmo com esse jogo que cria, com os movimentos ordenados a fim de gerar humor pelo absurdo. Se Tati, em Play Time, fazia piadas com uma maçaneta parecendo um chifre do porteiro, Abel e Gordon criam jogos semelhantes ao despir e vestir um personagem dopado, fazendo-o dançar para lá e para cá, enquanto os dois sequestradores fazem o serviço ao mesmo tempo que não o deixam cair.Já a encenação mais frontal nada tem de simples, pelo contrário, não são poucas as escolhas mais chamativas que só são permitidas por conta dessa escolha, como o reflexo da detetive no vidro depois de um encontro acidental, que gera uma reação complexa, a partir do momento em que ela reconhece o outro personagem, mas ela não o reconhece. Mas é justamente pelo filme se voltar para a encenação e para o movimento, ignorando praticamente temas e personagens, que A Estrela Cadente se liberta das amarras narrativas mais convencionais e se permite ser o que quer a hora que quer. Assim, os personagens correndo sem sair do lugar na cama, o possível assassino tendo problemas com sua prótese e fazendo todo mundo correr em círculo (talvez a mais boba de todas as piadas do filme) ou o longa virar um musical dançado apenas em uma cena específica, em nenhum momento parece simplesmente escolhas aleatórias e desconjuntadas. Pelo contrário, formam justamente essa unidade que pode não ser original, mas é bem-vinda a, mesmo sem a mesma habilidade de um Tati ou Keaton, resgatar uma comédia por muito perdida, que não é puramente apenas física, mas uma combinação de todos os elementos da mise en scène, sem a dependência tão grande do texto.

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