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|Crítica| 'M3GAN 2.0' (2025) - Dir. Gerard Johnstone

|Crítica| 'M3GAN 2.0' (2025) - Dir. Gerard Johnstone

Crítica por Victor Russo.

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'M3GAN 2.0' / Universal Pictures

 

Título Original: M3EGAN 2.0 (EUA)
Ano: 2025
Diretor: Gerard Johnstone
Elenco: Jenna Davis, Allison Williams, Violet McGraw, Ivanna Sakhno e Amie Donald.
Duração: 120 min.
Nota: 1,5/5,0
 

M3GAN 2.0 abandona qualquer traço do terror e assume completamente a ação galhofa como um véu para esconder (mas nem tanto) o seu verdadeiro interesse: discursar a favor da Inteligência Artificial

Resistência (Disney), Alien: Romulus (20th Century/Disney), Robô Selvagem (Dreamworks/Universal), The Eletric State (Netflix) e agora M3GAN 2.0 (Blumhouse/Universal) são só alguns dos exemplos da mais recente tendência de imposição dos grandes estúdios, um discurso que torne cada vez mais palatável, com ar de inofensivo e até benéfico o uso indiscriminado da Inteligência Artificial. Todos vão usar exatamente o mesmo recurso, uma I. A. vilã malvadona que só pode ser combatida por uma outra I. A., a boazinha. Claro que tal artifício não é uma novidade, o monstro bom e o monstro mau, o animal gigante bom e o animal gigante mal, e até mesmo o robô bom e o robô mau são empregados constantemente por toda a história do cinema, sobretudo nos filmes hollywoodianos de grande orçamento. Inclusive, o segundo filme da franquia da boneca tecnológica rouba a premissa de Exterminador do Futuro 2, com M3GAN sendo o equivalente do T-900 em seu retorno, enquanto AMELIA se inspira no T-1000. Nada há de terror ou terrir aqui, todas as mortes são encenadas a ponto de qualquer elemento chocante não passar de uma sombra na parede ou um sangue espirrado no vidro, sem nunca nos ser mostrado os atos de fato (o primeiro já fazia um pouco isso para pegar a classificação indicativa PG-13, ou 12 anos no Brasil).

Só que os tempos são outros e essa premissa existente é ressignificada em um momento que inteligência artificial já é uma realidade e resultado da demissão em massa de diversas áreas cinematográficas (como dublagem, som, efeitos visuais e animação), além de terem presença cada vez mais dominante na reprodução de atores digitais, na escrita de roteiros e até na feitura completa dos filmes, uma normalização perigosíssima dos filmes inteiros feitos por imagens geradas por IA. Não à toa foi o tema central das greves de atores e roteiristas em Hollywood. Dessa forma, mais do que uma narrativa clássica, a I. A. boa é resultado do maior projeto dos empresários hollywoodianos no momento, a normalização dessa figura historicamente mal vista, muito por culpa do cinema, inclusive, que sempre estabeleceu essa tecnologia pensante como um exterminador ou dominador da raça humana. Agora o processo é o contrário, os estúdios tentam a todo custo fazer o público se afeiçoar pela I. A., ou ao menos não ver problema nela. A partir do momento que essas figuras parecem dóceis, bonitinhas ou boazinhas e o público passa a aceitá-las, os estúdios têm ainda mais poder para excluir o material humano e fazer os filmes por algoritmos e I. A. generativa, deixando de lado o viés artístico e tendo um lucro total sobre esses filmes/produtos. É Hollywood fazendo o que sempre fez de melhor, um discurso ou um viés sendo incutido na cabeça do público sem que esse perceba, já que, no final do dia, os espectadores acreditam estar vendo apenas entretenimento inocente.

Nesse sentido, dos longas citados no texto, sejam eles bons (como Robô Selvagem e Alien: Romulus), medianos (Resistência) ou péssimos (The Eletric State), todos disfarçavam esse discurso, ou não tinham nele o cerne do filme. O longa da franquia Alien, por exemplo, voltava seu interesse para o horror de sobrevivência no espaço, trabalhando com a final girl e todos os demais elementos dessa série de filmes, enquanto Robô Selvagem focava no encantamento da imagem e das relações entre seres excluídos, a ponto da I. A. malvada nem ser o grande objetivo do longa. M3GAN 2.0 é o primeiro, então, a tornar esse discurso escancarado. Ou mais do que isso, a fazer desse debate pró-I. A. o filme em si, a razão da obra existir. Ela até se reveste como uma galhofa de ação, com essa protagonista espirituosa e provocativa (razão dos poucos bons momentos do longa), mas, no final, quase tudo se resume ao discurso central, sendo provavelmente uns 90% do filme tomado por diálogos expositivos que demarcam esses atores bons e maus, enquanto explicam também o funcionamento da I. A. e todos os seus usos.

O que falta, então, é vontade de fazer cinema. A obra sobre a inteligência artificial parece ter sido gerada por uma, a ponto de nem valer a pena nomear o diretor ou os roteiristas do longa. Os que mais sofrem são os atores, em atuações mais robóticas do que os robôs, obrigados a falar longos textos expositivos sem parar, como se tivessem lendo um teleprompter com as falas deles. No final do dia, esse discurso, por mais explícito que seja, provavelmente passará por baixo do radar, não será visto como um problema, mas como apenas mais um entretenimento qualquer. E assim a tendência a favor da I. A. vai sendo cada vez mais normalizada, nos tornando imunes a ela a ponto de nem mais questionarmos.


 

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