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|Crítica| 'Bailarina - Do Universo de John Wick' (2025) - Dir. Len Wiseman

|Crítica| 'Bailarina - Do Universo de John Wick' (2025) - Dir. Len Wiseman

Crítica por Victor Russo.

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'Bailarina - Do Universo de John Wick' / Paris Filmes

 

Título Original: Ballerina (EUA)
Ano: 2025
Diretor: Len Wiseman
Elenco: Ana de Armas, Keanu Reeves, Anjelica Huston, Norman Reedus, Lance Reddick e Ian McShane.
Duração: 125 min.
Nota: 3,5/5,0

 

Bailarina joga mais no seguro do que busca expandir a mitologia, mas, ainda que tenha a cara de um subproduto de John Wick, mantém um interesse devoto em encenar, se divertir e mover a narrativa pelas sequências de ação

É difícil falar de Bailarina sem primeiro citar as regravações amplamente divulgadas e que não poderiam ser mais perceptíveis no resultado final da obra, aqui, em grande medida, de forma muito mais positiva do que naquela típica relação meio frankenstein que esse comum processo muitas vezes gera. O longa, que tem Len Wiseman creditado como diretor, já gerava desconfiança nos fãs da franquia desde o anúncio duplamente preocupante: seria o primeiro longa do universo John Wick não dirigido por Chad Stahelski (que dividiu os créditos com seu parceiro e sócio David Leitch em De Volta ao Jogo, para depois assumir a função sozinho nos três seguintes), um ex-dublê e coordenador de dublês e mestre em pensar e dirigir cenas de ação (com referências declaradas ao cinema de artes marciais asiático), e também a escolha do substituto na função em alguém que tem vinculado ao seu nome apenas quatro obras nada inspiradoras, como Duro de Matar 4.0, o remake de O Vingador do Futuro e ainda dois filmes da série Anjos da Noite. Ao que tudo indicada e foi veiculado, a apreensão estava certa e resultou em mais de três meses de regravações, sobretudo das cenas de ação (descritas como desastrosas nas filmagens iniciais), mas, dessa vez, não mais por Wiseman, e, sim, por Stahelski tentando salvar o que tanto ama.

O resultado se faz presente, para um certo alívio, ainda que não tão empolgante para aqueles que amam esse mundo de assassinos. Ainda que dê para perceber Wiseman em muitos momentos, sobretudo na condução da história de Eve, sua origem e motivação (o que tem de mais fraco no longa, inclusive), além de muitas cenas mais simples e um tanto mal acabadas de diálogos, fica bastante claro para quem se acostumou com a condução única das sequências de ação de Stahelski que praticamente toda a pancadaria, perseguição e tiroteio do longa foi resultado do rearranjo de curso feito nas regravações. É justamente essa correção que faz, por exemplo, Bailarina se inserir muito mais facilmente dentro do universo John Wick do que o primeiro spin off, o prequel Continental, uma minissérie do Prime Video de origem do hotel mais famoso desse universo e também a inserção de Winston nesse submundo do crime, que tem muito mais interesse em diálogos e na história do que nas poucas, espaçadas e mal acabadas sequências de ação. 

Claro que Bailarina chega então com um peso diferente, não só por ser o primeiro derivado em filme para o cinema, mas também por Continental não ter recebido muita atenção e, principalmente, por se passar no mesmo período dos longas anteriores, com a tão divulgada aparição de John Wick (Keanu Reeves) no filme derivado. É, então, uma história de origem que precisa se sustentar com a sombra de um dos universos mais bem-sucedidos do gênero e que redefiniu o cinema de ação hollywoodiano contemporâneo pairando a todo instante. É uma obra vítima de comparação, correndo o risco de virar um subproduto caso siga uma linha semelhante dos quatro filmes anteriores, mesmo que seu apreço pela ação seja infinitamente acima da média do gênero. Caso se distanciasse muito dos outros longas, causaria um incômodo (como a minissérie), mas ser muito parecido soaria como falta de continuidade e expansão do universo (algo que não só um derivado promete, como é uma tônica recorrente da franquia, de ampliar conceitos e dinâmicas daquele mundo a cada novo capítulo).

Dessa forma, a salvação de Stahelski vem mais no sentido de não inventar muito, fazer um feijão com arroz bem feito, não destoando muito dos demais, mantendo um interesse semelhante pelo universo, suas regras, e a condução de uma narrativa incessante pelas sequências de ação, mas sendo também um tanto refém do que veio antes, sobretudo da figura do próprio John Wick. Se a seita é uma inserção nova e interessante, assim como a cidade na qual habita e a ameaça que isso apresenta, tudo que diz respeito à construção de Eve nesse mundo é uma tentativa de replicar John, mas agora em uma versão feminina. A figura da bailarina surge mais como a projeção de uma vida idealizada e impossível (na qual, a amiga da protagonista pôde viver), do que algo integrado à movimentação da personagem em seus conflitos corpo a corpo (nesse sentido, todos os John Wick têm uma encenação que se assemelha mais a uma dança do que Bailarina). Todos os elementos que a movem (com exceção do treinamento na Ruska Roma, que nunca vimos o protagonista da série passar, apenas sabemos que aconteceu) a narrativa, desde a premissa de vingança e rompimento das regras impostas à personagem, até o gancho ao final, em muito se assemelha ao que já vimos com o personagem masculino, e qualquer nova possibilidade de mudança e tomada de rumo próprio para Elle, como a garotinha que aparece em seu caminho ou a irmã, são retirados para que ela siga esse caminho mais tradicional da franquia.

Porém, ainda que pareça um “John Wick genérico” em muitos momentos, Bailarina ganha uma cara própria ao lidar com uma personagem que se apresenta muito mais inexperiente (ainda que física e mentalmente muito hábil) nas sequências de ação e nos métodos para sobreviver, sendo emboscada mais de uma vez, por exemplo. O que é maduramente percebido pela encenação de Stahelski, mas rende também uma sequência meio boba piscando para fã, ao colocar Reeves lutando e vencendo com certa facilidade De Armas (que faz um grande trabalho, por sinal, apesar do desenvolvimento da personagem não ser tão bem escrito). Em meio a tudo isso, o que faz esse gosto por vezes agridoce do filme ser mais doce do que amargo, é justamente o prazer que ainda tem pelo gênero e por se divertir com o que já foi criado naquele mundo. Não há a permissão de ser um filme menor como De Volta ao Jogo, a partir do momento que muita coisa se expandiu depois deste, mas a busca por continuidade da franquia a partir do primeiro longa da personagem seria arriscado demais. O mundo já existe, assim como uma proposta de encenação e narrativa, resta, então, se divertir com esses pilares e é isso que Wiseman (na verdade, Stahelski) faz, pelo já sabido, como o improviso, o uso de objetos de cena variados como arma, a maneira de segurar e manipular a arma e se movimentar pelo espaço, mas também e principalmente com algumas novas ideias, destaque para a sequência das granadas e, sobretudo, a do lança-chamas.

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