|Crítica| 'Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa' (2025) - Dir. Fernando Fraiha
Crítica por Victor Russo.
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'Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa' / Paris Filmes
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Fernando Fraiha encontra graça para crianças e adultos nostálgicos na figura de Isaac Amendoim, dando alguma brasilidade para um filme sustentado por artifícios hollywoodianos
Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa é mais do que um grande filme, é o tipo de obra que o cinema brasileiro é um tanto carente. Há uma capacidade harmoniosa em mirar no público infantil sem esquecer os adultos, que, no fundo, são quem mais se conectam com a Turma da Mônica, por uma nostalgia em ler esses gibis, e agora levam os mais jovens para as salas de cinema apresentar o divertido filme de Fernando Fraiha, o mais bem acabado entre as adaptações recentes de Maurício de Sousa para as telonas, com início em 2019, com Turma da Mônica: Laços. Se muito se diz sobre os elencos infantis desses filmes, Isaac Amendoim dá um banho em todas as crianças de obras anteriores, com Fraiha sabendo aproveitar a graça do garoto, assim como a sua maturidade de um menino que parece mais velho do que realmente é e, ao mesmo tempo, ingênuo e destemido. É um longa bastante consciente do seu lugar, da sua inocência, da simplicidade da história, assim como do cartunesco que são os seus personagens, dos heróis aos vilões, passando pelos pais abobalhados e a fantasia da árvore mágica (Taís Araújo). Sabe-se do nome, do peso dessas histórias e personagens no imaginário popular, basta tratá-los com carinho, e isso Fraiha faz com um tanto de cuidado, sobretudo pela fotografia, com um filtro alaranjado que remete a esse campo ensolarado, a esse lugar mágico que é tão brasileiro quanto real e fictício ao mesmo tempo: a Vila Abobrinha.
Entretanto, se o longa ganha em doçura e na quase rejeição a uma visão mais crítica por parte uma parte grande dos profissionais da área, justamente por se bastar em ser bonitinho, divertido e nostálgico, há de se ressaltar também como para obter tal resultado e, em boa medida, é bastante palatável para a maioria por isso, o longa é uma apanhado de artifícios e visões bastante características da Hollywood atual, da concepção base às escolhas de roteiro, decupagem e montagem, além, claro, daquela caricatura do interior brasileiro tão enraizada na nossa cultura popular, que nem questionamos mais os sotaques forçados, às vezes um tanto constrangedores, ou as figuras mais brutas e ignorantes como parte de um imaginário meio preconceituoso que se tem do campo, escorado na obra de Maurício de Sousa e seus personagens de gibi como justificativa para tais construções, no mínimo, questionáveis, mas que, nesse caso, serão compreensivelmente ignoradas por aqueles que tanto clamam por filmes educativos e certinhos (não me coloco nesse lugar e nem vejo com tanto problema as caricaturas que ganham as telas aqui).
O que mais enfraquece a obra mesmo está nessa percepção de um cinema mais popular brasileiro de falar sobre Brasil sob uma estética muito pouco nacional. É a importação dos artifícios hollywoodianos como uma percepção de identidade nossa, com um público que se moldou por obras estadunidenses a ponto de reconhecer os filmes desse país como o seu cinema, enquanto o que vem do audiovisual brasileiro é tratado como gênero. Nesse sentido, Fraiha não só sustenta tudo a partir de uma visão nostálgica, em um longa que funciona sim para as crianças, mas, muitas vezes, é mais direcionado a esses adultos que foram influenciados por Hollywood a quase dependerem da nostalgia e das referências para se divertir. Não à toa, em grande medida, as escolhas aqui muito se aproximam daquelas sedimentadas pela Marvel, como o cameo de Maurício de Sousa (clara referência ao que o MCU, e até antes dele, estabeleceu com Stan Lee), a decupagem que necessita sempre de um corte na ação para a piadinha, sendo Zé Lelé (Pedro Dantas) utilizado apenas para isso, a quebra da quarta parede como uma muleta para iniciar e fechar a narrativa, ou mesmo se usar da Turma da Mônica para surfar uma onda oitentista que Hollywood vem tentando resgatar há anos, da narrativa de crianças que resolvem tudo, enquanto os adultos são estúpidos e precisam aprender com elas, muito popular por conta de Os Goonies, E. T., e, mais recentemente, Stranger Things. Assim, Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa funciona para todos os públicos, ainda que nem sempre com a brasilidade ou mesmo direcionamento para o público infantil que pretende. A verdade é que os adultos se infantilizaram tanto nos últimos anos, sobretudo com esse mar de obras de heróis PG-13, que fica difícil distinguir o que é para criança hoje em dia.