|Crítica Mostra 2024| 'Saturday Night' (2024) - Dir. Jason Reitman
Crítica por Victor Russo.
'Saturday Night' / Sony Pictures
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A câmera de Jason Reitman se interessa por encontrar personagens e dinâmicas no tempo e no espaço
Quase 50 anos depois, a noite de abertura do Saturday Night Live é palco para um filme de bastidores, na tradicional ideia da história por trás das câmeras nunca contada. Nesse sentido, Jason Reitman não seria o primeiro nome que viria a mente para um projeto como esse, sobretudo porque o interesse não está exatamente nos personagens, nas personalidades e no desenvolvimento dramático deles, mas no caos que são esses bastidores, a correria, o desespero e as piadas daqueles artistas que são por trás das câmeras pelo menos um pouco do que se apresentam diante delas. Se em algum momento do longa Lorne Michaels (Gabriel LaBelle), criador do programa e o mais próximo que o filme chega de um protagonista com algum interesse psicológico, fala que, caso o programa desse errado, eles poderiam passar os bastidores (criando uma metalinguagem e autorreferência também com a obra de Reitman), é porque tudo que acontece naquelas salas e corredores é instigante o suficiente para gerar entretenimento.
Assim, Reitman se despega um pouco do que fez durante boa parte da carreira e pega emprestado um estilo que não é o seu, mas que conversa muito mais com o que os irmãos Safdie fariam. Há uma certa obviedade em muitas das escolhas ou até uma necessidade de forçar um discurso mais moderninho e engraçado que o diretor não domina tão bem, como na repetição da piada em que opositores ao programa verbalizam que aquilo nunca vai ao ar ou que os envolvidos estarão esquecidos na semana seguinte, uma brincadeira com o público, ciente do sucesso que aquelas esquetes se tornaram, e uma própria autoexaltação do longa em si, o que no começo até gera graça, mas depois vai virando uma piada meio protocolar. Entretanto, mesmo saindo da sua zona de conforto e nem sempre acertando no alvo como deseja, Reitman consegue estabelecer bem esse filme sobre a dinâmica do local e da relação entre o tempo da projeção e dos acontecimentos diegéticos. O desespero que se dá por ver tudo dando errado a menos de 90 minutos do programa entrar no ar gera uma modificação em como sentimos o tempo, com dois ou três minutos parecendo muito mais quando surge um problema ou o protagonista fica preso em alguma conversa insignificante. Mesmo quando se usa de planos-sequências, passeando pelos espaços e personagens, o tempo é sempre mutável entre o real e a ficção, permitindo assim a Reitman criar uma série gigantesca de cenas que acontecem em um período muito limitado, às vezes, possivelmente, ocorrendo ao mesmo tempo.
Nesse sentido, o cineasta domina muito bem o espaço cênico, criando uma espécie de labirinto incompreensível, dando uma ideia de que aqueles lugares estão em constante movimento, assim como os personagens que nunca ficam presos a uma sala, palco ou corredor. Mas a graça mesmo vem da escolha de casting e como ela se relaciona com o programa real. Nomes como Chevy Chase, John Belushi e Dan Aykroyd, que viriam a ser grandes nomes da comédia, ainda apareciam em começo de carreira, mas com personas destemidas e até arrogantes, como se pudessem prever o que seriam para a televisão e para o cinema. Cory Michael Smith, Matt Wood e Dylan O’brien, respectivamente, assim como todo o restante do elenco, revelam essa boa direção de atores que Reitman é conhecido por, conseguindo criar personagens que trazem as características das pessoas reais, mas sem nunca soar como caricaturas, da mesma maneira que toda a reprodução daquela época também não é uma caracterização típica de Hollywood que grita o que quer ser. Tudo soa muito natural dentro desse caos de pouco mais de 90 minutos e Reitman consegue conduzir com a mesma diversão que os personagens têm em suas falas rápidas e piadas incessantes.