|Crítica| 'Moana 2' (2024) - Dir. David Derrick Jr., Jason Hand e Dana Ledoux Miller
Crítica por Victor Russo.
'Moana 2' / Walt Disney Studios
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Com cara de filme do meio, Moana 2 segue receita de bolo sem muita inspiração, replicando o que ficou popular no primeiro e deixando as portas abertas para uma continuação
Nunca filmes “inofensivos” fizeram bilhões de dólares como atualmente. Moana 2 em muito se assemelha à maioria das sequências de animações da Disney, filmes esses que inundaram as locadoras em VHS, e posteriormente em DVD, durante as décadas de 1990 e 2000. Tarzan, Rei Leão, Aladdin, Branca de Neve, A Bela e A Fera, Lilo & Stitch ou qualquer outra animação do estúdio lançada nesse período ou antes teve não uma, mas algumas sequências, além de muitas vezes séries em desenho animado para TV. O reaproveitamento de produtos que já estavam no imaginário popular não é uma novidade dos anos 2020, longe disso, desde os monstros da Universal na década de 30 (ou talvez antes), Hollywood já entendia a possibilidade de montar universos, fazer remakes, sequências, crossovers, nem que fosse (e na maioria das vezes era) com um orçamento mais baixo do que o original e focado apenas para um público específico. Mais do que isso, tal prática passa longe de ser apenas americana, é presente em qualquer indústria cinematográfica, sobretudo nas maiores, como é facilmente perceptível nos universos dos cinemas e produções para a televisão japoneses. Então, o que mudou? Por que sentimos que hoje em dia só existe remake, reboot, continuações, revivals e afins?
A quantidade dessas obras pode até ter aumentado, mas não é exatamente nesse lugar que sentimos a diferença. Em parte, claro, está o fato de que com o tempo essas produções esquecíveis ficam pelo caminho. Quem lembra do sétimo Halloween, do segundo Meu Primeiro Amor, do terceiro O Exorcista, ou do spin off de Lilo & Stitch? Pouquíssimas pessoas certamente. Mas se, em grande medida, esses filmes são esquecidos também é justamente porque eles existiam, mas não eram o foco da discussão mundial, não ocupavam grande parte das salas de cinemas durante várias semanas. Eram produções quase sempre mais baratas, destinadas aos fãs do universo, com a compreensão da qualidade mais baixa tanto por quem produzia quanto por quem consumia. Hoje, a dinâmica mudou, os estúdios conseguiram criar uma estrutura que empurra goela abaixo no público (até porque só tem isso dominando as salas da maioria dos cinemas do mundo) essa repetição do que já existe, a facilidade de vender nostalgia e continuidade de universo, sem precisar se arriscar com filmes de médio orçamento que não gerarão sequências. Pelo menos esse é o pensamento, claramente falho, como percebermos com a grande quantidade desses filmes que pouco lucram ou até geram gigantes prejuízos. A cada Furiosa mais inventivo que sai, são 5 ou 10 Twisters, Moana 2, Frozen 2, Os Fantasmas Ainda Se Divertem e por aí vai (alguns até muito bons, como o recente Alien: Romulus, mas que se escora completamente no original ainda assim). O público foi condicionado pela indústria a acabar de ver um filme já esperando sua sequência (esse talvez seja o maior ganho comercial que o Universo Marvel entregou a todos os grandes estúdios em forma de moldar o público para produtos contínuos e supostamente infinitos). Então, se estamos cansados de ver gente reclamando nas redes sociais sobre não aguentar mais sequências, na prática, a maioria delas segue dando dinheiro para essas obras, porque é o que nos resta ver, pelo menos ao público mais casual que vai ao cinema como consequência de um passeio no shopping.
Dessa forma, Moana 2 é tão inofensivo e até um pouco melhor do que a maioria das sequências de animações que a Disney fez em sua história, e inicialmente seguiria uma lógica até parecida, não mais com as locadoras, mas sendo uma série para o Disney+. Só que a visão de empresário sempre fala mais alto, se um longa fraquíssimo como Frozen 2 gerou tanto dinheiro (e segue dando mais ainda em seus produtos secundários), por que não fazer o mesmo com Moana, outro sucesso de bilheteria da Disney? O “inofensivo” de hoje não é mais direcionado, é dominância de mercado, o menor esforço para o grande lucro.
Assim, o longa aposta totalmente na reutilização do que já deu certo, com um visual quase idêntico ao da animação de oito anos atrás, dando destaque para os cabelos, e ainda perdendo em profundidade, com a exploração dos mesmos alívios cômicos, mas agora inserindo ainda mais personagens irrelevantes para a trama, no discurso de que a protagonista não pode resolver tudo sozinha, é preciso de um grupo que se ajuda para unir todos os povos (Disney pagando de comunista e rejeitando a individualidade? Até parece!), o que na prática pouco altera os acontecimentos de um roteiro com a mesma estrutura, mas dá uma gama de novos bonecos para serem licenciados. O vilão é mal trabalhado a ponto de nem existir fisicamente, os conflitos são bobinhos, as canções não passam de um protocolo desse formato de animação, sem a potência mais marcante das do primeiro filme (Lin-Manuel Miranda não retornou para compor as da sequência e a diferença é gritante). No fim, é um filme que parece autoconsciente do quão genérico é, como uma receita de bolo que se repete com algumas modificações e deixa tudo para uma possível sequência (que certamente será feita se esse der dinheiro). O discurso ingênuo da união dos povos, supostamente bonitinho e educativo para as crianças, revela tudo sobre o longa, o mínimo esforço, com muita coisa feita por IA para baratear os custos, “um copia, mas não faz igual” que é muito menos inocente do que os filmes que iam para as locadoras nos anos 90 e 2000, justamente porque esse longa fofinha, mas preguiçoso é pensado para dar bilhão.