|Crítica| 'Pacto de Redenção' (2024) - Dir. Michael Keaton
Crítica por Victor Russo.
'Pacto de Redenção' / Diamond Films
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Michael Keaton, sem se desvencilhar dos clichês, reconhece que o seu tempo já passou, mas preserva uma certa nostalgia conservadora com o passado
Pacto de Redenção é mais um desses longas que chegam ao Brasil com atraso e sem muito alarde, conservando uma estética e narrativa de locadora, sem se desvencilhar dos clichês que marcaram esse thriller com protagonistas assassinos por aluguel em final de carreira. Assim como Liam Neeson e tantos outros, Michael Keaton vive esse personagem com complicações de saúde e perdendo a memória, com a diferença de que Keaton não é apenas o protagonista do longa, mas também retorna como cineasta depois de muitos anos, dando uma carga a mais ao personagem e aos discursos embutidos na obra. De forma geral, o cineasta é até competente em construir essa narrativa mais manjada do plano elaborado como gran finale que vai revelando suas peças aos poucos e que o público só reconhece tudo ao final (ainda que aqui fique bastante evidente o dispositivo do esquecimento como uma tentativa frágil de ludibriar o público. Qualquer espectador minimamente sagaz reconhece tudo com muita antecedência). O roteiro até usa esse elemento-chave do protagonista como muleta, mas ainda é eficiente em como trabalha a condição com a aleatoriedade que ela impõe. O problema não está aí.
Só que Keaton se revela um diretor frágil o suficiente em como encena esse roteiro, reduzindo a decupagem quase sempre ao plano e contra plano mais convencional, e, sobretudo, em como retrata os esquecimentos e perda de noção espaço-temporal do protagonista, com flashes, efeitos sonoros e câmera balançando, recursos batidos típicos de um diretor iniciante. A dificuldade é tamanha que ele precisa inserir diálogos posteriores para entendermos o quê do que vimos o personagem lembra e o que ele esqueceu. Tudo é de uma falta de inventividade de encenação gritante, reforçada pela falta de pontos de vistas em como situa essa narrativa, que cai nesse lugar genérico de ir de um espaço para o outro e ter os personagens apenas como peões de explicações na maioria das vezes, até recorrendo a momentos mais desconjuntados, como o que o filho (James Marsden) aleatoriamente agride um cara que supostamente teria olhado para a filha dele, em uma tentativa completamente ingênua e aleatória de adentrar os pensamentos desse personagem, que param por aí, nessa superfície até meio ridícula, ainda mais por como tudo é filmado de uma forma repentina.
Só que, se por um lado Keaton parece ter uma consciência grande desse discurso de que o seu tempo já está passando, reforçado por ele mesmo fazer o protagonista e trazer junto Al Pacino, vivendo um personagem que basicamente é um apoio consciente da sua própria obsolescência, tudo se evidenciando mais em como esses personagens recorrem a mulheres mais jovens, no caso do protagonista desenvolvendo uma relação com a prostituta polonesa (é uma pena que Joanna Kulig tenha só esse tipo de papel em Hollywood, bem aquém do seu talento), por outro, há uma nostalgia muito grande em como ele retrata o seu personagem e, sobretudo, em como insere discursos um tanto conservadores para ridicularizar os mais jovens. Por mais que viva esse assassino por aluguel, o personagem de Keaton (e o de Pacino) é dominado por um senso de empatia, longe de ser resultado de sua condição física, mas muito presente em como sente a dor dos dois inocentes que matou, em como pensa naqueles que saíram de sua vida, inclusive servindo como alguém capaz de ser um mentor intelectual da prostituta, que só consegue ver a superfície das obras, e ainda lembrando dela mesmo depois de ser traído pela mesma, deixando a ela os seus livros (o caminho é estudar para virar alguém, ele parece dizer. Sério mesmo Keaton?). A personagem de Kulig é ainda mais estereotipada ao ser essa imigrante que trai quem sempre a tratou bem por pura ganância, a visão do imigrante como um ser selvagem frente ao civilizado protagonista (de novo, sério mesmo?. Mas não para por aí, caindo em estereótipos ainda mais tolos quando ridiculariza o fato do filho ser vegano, fazendo-o comer uma costela e dizer que estava passando fome desde que parou de consumir carne (mais uma vez, sério mesmo?) ou com a detetive (Suzy Nakamura) fazendo um discursinho de que o subordinado só pensa em homens capazes de executar aqueles crimes, apenas para depois ela cair em contradição e ser sacaneada pelo colega (outra vez, sério mesmo?), aquela ideia idiota da pessoa de esquerda como um hipócrita. Assim, no final, Keaton reconhece que está ultrapassado, mas parece manter-se firme no discurso que antes tudo era melhor e que agora o mundo está perdido. O pior é o filme acreditar que está realmente sendo sutil ao fazer isso.