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|Crítica| 'Passagens' (2023) - Dir. Ira Sachs

|Crítica| 'Passagens' (2023) - Dir. Ira Sachs

Crítica por Victor Russo.

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'Passagens' / MUBI & O2 Play

 

Título Original: Passages (França)
Ano: 2023
Diretor: Ira Sachs
Elenco : Franz Rogowski, Ben Whishaw, Adèle Exarchopoulos, Erwan Kepoa Falé, e Théo Cholbi.
Duração: 92 min.
Nota: 2,5/5,0

 

Os silêncios e planos vazios que constroem o realismo dramático não são suficientes para sustentar personagens e uma trama tão desinteressantes

Franz Rogowski, Ben Wishaw e Adèle Exarchopoulos em um triângulo amoroso erótico é mais do que suficiente para despertar o interesse de qualquer cinéfilo. E, nesse sentido, Ira Sachs consegue ser bastante explícito e fervoroso nessa abordagem sexual que domina a trama. O cineasta entende Tomas (Rogowski) como alguém controlado pelo desejo, quase um predador sexual, o que se reflete em cenas de sexo dele tanto com Martin (Wishaw) quanto com Agathe (Adèle) com pouco amor, mas muito tesão, um impulso até meio raivoso, desesperado e incontrolável. São os únicos momentos em que Sachs consegue dar algum tipo de fervor ao longa, fazendo-nos esquecer dos desinteressantes personagens que fazem a trama andar em círculos.

Não que não haja uma ideia por trás de toda a narrativa do longa. Sachs tenta emular justamente uma vida de idas e vindas, já que seguimos esse personagem indeciso e incapaz de pensar muito além de seus impulsos (pelo menos em teoria). Os diversos silêncios e planos até longos que se esvaziam, antes dos personagens retornarem ou não para o quadro, corroboram com essa proposta de distância emocional, de pessoas, sobretudo Tomas, que parecem sozinhas mesmo quando estão com mais de uma pessoa ao mesmo tempo. A distância entre a companhia e o simples matar a vontade sexual.

Só que assim como eu relatei no parágrafo anterior, Sachs parece seguir tudo como uma cartilha estética. Ele nunca consegue dar qualquer tipo de pulsão que torne minimamente interessante nos fazer olhar para aqueles personagens de classe média alta vivendo na França e cheios dos chamados “white people problems”. Por mais que tal termo geralmente seja vazio, pois o cinema já se mostrou capaz de construir interesse e narrativas sólidas sobre personagens das mais variadas cores, classes sociais e questões emocionais, em “Passagens” ele não poderia ser mais assertivo. É quase como se o longa tentasse criar problemas para dar algum tipo de importância para aqueles personagens e mundo desinteressantes. Mas todo o esforço do diretor em se usar de uma decupagem que busca um certo realismo naquele distanciamento, nunca tem um real efeito no espectador.

Tudo isso se acentua ainda mais quando percebemos que Sachs entende todas as dúvidas do seu protagonista, que são até bem legítimas, mas busca uma empatia por ele. A forma como ele filma Rogowski ou o coloca em posições de vítima, como na sequência do jantar com os pais de Agathe, são uma clara tentativa de nos fazer sentir as dores desse personagem, entendê-lo e até sentir pena dele. Isso até funcionaria se Tomas não fosse simplesmente uma pessoa ruim, o que o diretor parece não perceber. Por mais que as dúvidas emocionais permeiem o personagem, fica claro que ele faz quase tudo de caso pensado, pouco se importando se aquilo vai machucar as outras pessoas. Ele simplesmente não liga, e Sachs até reconhece isso, como na sequência em que ele transa com Martin no quarto ao lado de Agathe, quando estava em um relacionamento com ela. Essa busca por empatia então soa no mínimo contraditória e só não é mais incômoda porque os personagens de Whishaw e Adèle são tão sem sal (culpa do próprio filme que parece não terinteresse por eles) que fica difícil ter qualquer tipo de preocupação com o mal causado a eles por Tomas. No fim, “Passagens” é um filme que acontece, mas pouco fica. É o raro caso de um longa tão sexualmente ativo ser tão distante e desinteressante, incapaz até de chocar ou incomodar, como muitas obras desse tipo fazem.

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