|Crítica| 'Ursinho Pooh - Sangue e Mel' (2023) - Dir. Rhys Frake-Waterfield
Crítica por Victor Russo.
'Ursinho Pooh - Sangue e Mel' / California Filmes
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Toda a frontalidade proposta se perde em um horror supostamente gráfico incapaz de mostrar sua obsessão pelo ato de matar
Não é de hoje que falo sobre uma onda de filmes de terror trash mais populares que pouco tem a ver com a essência mais genuína e ingênua dessa vertente do gênero. Se antes, filmes como "Evil Dead" e "Fome Animal" (só para citar dois exemplos) existiam em uma lógica meio distanciada da padronização do gosto característica de Hollywood, sobrevivendo como obras de baixo orçamento, que precisavam ser inventivas (e às vezes geravam novas técnicas para o cinema mainstream, como a sequência de abertura do primeiro "Evil Dead") e construíam um certo exagero meio tosco de forma inata, sem uma pretensão comercial, vivemos atualmente uma tendência de filmes que subverteram o trash para fins econômicos.
Tudo bem, isso não é novidade, Robert Rodríguez mesmo construiu boa parte de sua carreira em um cinema trash de alto orçamento, criando quase um fetiche pela ruindade, ou como muitos diriam "filmes que querem ser ruins". Mas mesmo a filmografia de Rodríguez ainda era carregada de alguma personalidade, um exagero consciente muito próprio dele, mesmo que a grande maioria dessas obras sejam bem ruins. Ou seja, é como se ele se interessasse e amasse fazer aqueles filmes, não se importando com a repercussão a partir deles.
Há uma diferença então do trash em seu estado mais puro ou mesmo desse desenvolvimento nas duas últimas décadas para essa apropriação mais recente. Trata-se de um momento em que a ruindade e a violência gráfica se tornaram elementos de caráter descolado e divertido, quase uma resposta à "ditadura" do PG-13 que domina o cinema comercial. Só que não há nada de resistência nesse movimento, trata-se do sistema que padroniza o gosto se apropriando do trash para fins lucrativos como sempre. É o antissistema virando sistema. Foi assim com obras recentes como os "Terrifier", sobretudo o segundo, "O Urso do Pó Branco", e é assim com "Ursinho Pooh: Sangue e Mel". Ou alguém realmente acredita que transformar o Ursinho Pooh em um assassino de terror slasher não é uma ideia que nasce pensando em chamar atenção pelo inusitado que pode gerar lucro?
Porém, para além dessa fetichização do trash que domina boa parte das produções desse tipo, o longa de Rhys Frake-Waterfield ainda tenta conservar um elemento essencial ao terror trash e ao slasher: a frontalidade. Ainda que seja um filme que praticamente rejeite os chamados jump scares, talvez o elemento mais frontal do terror, “Ursinho Pooh: Sangue e Mel” mira no gore e na obsessão do slasher pelas mortes, ou melhor, por mostrar da forma mais gráfica o ato de matar. O problema é que tal proposta pouco funciona na prática pela inabilidade do cineasta em filmar as mortes. Com exceção de uma, envolvendo uma faca, as demais mal são vistas, já que, ora o cineasta as esconde colocando personagens na frente, ora só as sugere, cortando abruptamente antes do ato ser mostrado. Mas isso fica ainda pior quando a fotografia escura se torna o impeditivo para o público ver a morte acontecendo de sua posição macabra de voyeur com prazer pelo sangue.
Assim, “Ursinho Pooh: Sangue e Mel” não só é apenas mais um trash que se coloca no lugar de “o objetivo era ser ruim mesmo”, como falha miseravelmente em sua obsessão por mostrar e se divertir com o ato de matar. Sobra apenas uma tosqueira que mais se esconde do que se mostra para o público voyeur.